Geral

TÚNEL VESGO

 

 

 

estava em busca

dos ferrolhos rompidos

no túnel vesgo

que não conduz à saídas

 

estava no invólucro

de um caramujo rasteiro

como a larva no casulo

rompendo a casca madura

 

estava coletando letras

para cunhar palavras urgentes

um sussurro qualquer inaudito

que me valesse o batente

 

estava meneando lustres

como aleluias possessas

no afã de capturar

seu lúmen e calor confessos

 

 

 

 

 

 

Um vício chamado música

Os raios fortíssimos pausaram-me,
Alberto Caeiro jamais aceitaria
Mas, a Natureza rebelou-se,
Foi impetuosamente contra a poesia:
Os raios cegaram-me a visão.
Sem olhos (ou energia elétrica)
Não observo meus poemas,
Assim como não os sinto,
Nem os toco, nem penso, nem vivo.
A Natureza entendeu-me sozinha,
E sozinha cegou o azul do coração.

CONJUNTO OU SEPARADO

 

 

 

1.

estou a sós entre muitos:

indivíduo remoto

que não soletra a sorte

 

2.

não refuto a cautela

nem meus temores revelo

frente à ignomínia do caos

 

3.

sou atrelado ao meio

como uma partícula iônica

submissa às leis causais

 

4.

delineio minha esperança

através da observação

destas breves nuances

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Expectativas

Eu sou uma aposta de Deus
em um jogo a ser burlado
em algum casino de cartas sinistras
uma boa destilada para animar
enquanto se jogavam as cartas do baralho

Vencer todo pesadelo
mais fácil mesmo o raio cair
com a mesma intensidade
o ano inteiro
papai bem avisou:
sem trabalho honesto
não há dinheiro certo
que se possa ganhar

Brahma

No sonho eternal de Brahma
dorme as mazelas mundanas,
descansa no grande drama:
o fim das eras profanas.

Observando-se no éter
Ele experimenta e vê,
além da coroa Kether
Vos saúdam, Brahma! Ave! 

Andamento

Andando estive pensando na performance do meu andar. Meu andar transpassa cólera; marcho rente ao objetivo, o que é engraçado. Vejo o meu andar com bom humor: a autoestima na qual desconheço anda a passos largos do que realmente sou. Autoritariamente falo com meu corpo mentindo. Quem vê-me nas ruas enxerga-me categoricamente imperativo. A verdade do meu corpo, ou melhor, da alma, está nos passos inconvictos.
 
 

SOPRO

SOPRO
 
Existe... Tudo existe!
Do nada existe.
Do vazio? De um vácuo?...
O vácuo existe... Existe, sim!
Mas criado, do Alguém, criado!...
 
O antes, o  princípio!...
Antes?... Quando?
Não quando... Nem onde... Nem porquê...
Porque o antes, existe. Mas não o antes de tudo.
Existe?... Sim .. É?... Já antes de tudo...Era!
 
Existe tudo... até o que não se move!

Samurai

Minha haste finca na alma,
Presa na terra íngreme,
Soterrada na cruz que desalma
O sepulcro que se estremece.

Minha katana já não corta,
Inimigo não me teme,
Fui rasgado na faca torta,
E morto na vida tênue.

Sou samurai das mil sombras,
Nas catacumbas sou lembrado.
Não fui de seppuku ou sondas,
Fui de guerreiro a enterrado.

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