a admirável metamorfose
Autor: António Tê Santos on Saturday, 21 January 2017quando a tempestade me faz voar é dum abrigo que preciso para com a concha da mão colher um desregrado míssil que me empurre para uma guerra solitária.
quando a tempestade me faz voar é dum abrigo que preciso para com a concha da mão colher um desregrado míssil que me empurre para uma guerra solitária.
criei enredos que entregava às mágoas quando as advertências invalidavam a minha veleidade em tilintar o silêncio no isolamento imposto à imaginação: eram dissabores que eu trazia à superfície para camuflar as inquietações primordiais.
a têmpera dos protagonistas é avaliada trazendo à superfície os relatos que destampam a sua valentia; irrigando as flores que jazem sobre os seus túmulos; enchendo o vácuo com as suas comoções.
as inventivas explicam os laivos duma angústia, as grosserias exacerbando os pleitos que conduzem a caravela pelo itinerário das desafeições.
há tréguas que matizam este existir sangrento, versos que animam as danças inseridas nos catálogos das gentes, tópicos que poisam no tejadilho das desgraças dando-lhes consistência e exaltação.
Nesta sociedade hipócrita que sempre recusou,
A realidade de alguns que nunca tiveram nada.
Uma necessidade incendiada porque quem a queimou.
Um história esquecida, omitida ou alterada.
Eu sou quem eu sou, ação ou palavra,
Herdei do meu avô esta vontade de cantá-la.
Eu sou a voz infindável, garra imparável, a mão coberta de terra enquanto a escavava.
Eu sou cada dádiva, eu sou cada lágrima, eu sou a paz, a guerra, eu sou a raiva.
Sou a falta de sono, sou aquele que não esquece,
Ás vezes sou o frio que a noite te arreferece,
Na arrecadação da minha memória,
empoeiradas prateleiras
de livros com a história
de um passado que merecia o presente.
Rasgo a sombra.
Entro na luz
e viajo abraçada
a mim.
Esfolo a pele.
Arranco o cabelo.
Despersonificada a minha alma,
ergo-me num lugar onde uma sombra progride sem que os afetos alisem os alvoroços de raiz porque há formações que inovam as regras dirigindo o labor de serpentes caprichosas.
um toldo na praia deserta e sobre ele uma gaivota sintonizando a obrigação de produzir recados díspares numa liça que transmuta o desejo de pertencer à tribo que envia palavras soltas para um cemitério onde as vozes se repercutem, azafamadas.