Quotidianos
QUOTIDIANOS…
Os cânticos dos pintarroxos, dos pardais, das rolas da Índia, dos corvos madrugadores já me anunciam o início da aurora cinzenta. Na véspera a coruja e o mocho tinham anunciado uma noite escura, de negrume e chuva.
Chá das nove, bolachas, medicamentação, xixi e cama, que se faz tarde. “Deitar cedo, e cedo erguer, dá saúde e faz crescer.” No dia seguinte pequeno-almoço rápido. Consulta no fisioterapeuta, observou e verificou que o físico está melhor, o psiquiatra com optimismos. Físico e psíquico no bom caminho, é sinal de bom augúrio. Na fisioterapia, três quilómetros na bicicleta inamovível e menos duzentas calorias. Uma gota no oceano das recebidas, mas já não é chita. Falamos dos mares carregados de toneladas de plástico, o Homem vai sofrer se não tomar medidas, será um suicídio colectivo.
Na Biblioteca uma olhadela pelo correio electrónico. Na folha do Excel há sempre despesas: luz, água, seguros (segura-te e não caias), portagens…
De Aldeia de Joanes, o Ricardo Fernandes, sempre disponível para as minhas dúvidas e apelos.
O amigo Miguel Santos envia-me uma prosa poética… faz-me chorar, “o malandro.” Já lhe agradeci a dedicatória imerecida…
A visita de um velho amigo da Guarda, companheiro das lides prisionais (“permanentemente ao serviço”), que a caminho de Coimbra fez um pequeno desvio para me visitar. São estes os verdadeiros amigos. Chamadas, mensagens de Gouveia, Trancoso, Fundão, Lisboa, Setúbal, Coimbra, Condeixa-a-Nova, Castelo Branco, Orca, sempre com uma mensagem amiga. As negativas, tipo pica miolos, rejeito-as…vão para o lixo, são tóxicas.
No futebol feminino uma sova da equipa italiana. A comitiva da Seleção Nacional a caminho da Rússia, para o mundial da competição, vamos trazer o caneco? Todos a apontar para Moscovo.
Nos nossos ouvidos palavras de Marcelo Rebelo de Sousa: “sois os maiores, dos maiores.”
Nunca mais acabam as telenovelas de má qualidade do Sporting Clube de Portugal. Um grande clube nas ruas da amargura, notícia diária. Antes diziam que os acontecimentos eram Fátima, Fado e Futebol. Agora é só futebol, corrupção, corporativismo desenfreado, conversas histéricas. Ajuda a esquecer os aumentos, o custo de vida e por aí fora. O Povo, assim, diverte-se e tem tema de conversa, não precisa de anestesistas, nem de médicos. Estes vão para outros países. Os factos, os bons protagonistas, não têm audiências, não vendem papel. Na Banca falida todos os dias novos casos de dinheiros por caminhos que só as toupeiras conhecem. Planos maquiavélicos de corrupção, de operações em trinta e duas offshore, palavra esquisita, diabólica…
A dinamizadora das Marchas dos Santos Populares: “senhor Fernandes, são horas de irmos lá fora para os ensaios.” E eu com vontade de colaborar, vou…
Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, depois da Mesa da Eucaristia a Mesa do Almoço: sopa de creme de marisco à setubalense, bacalhau divinal à fundanense e arroz doce à avó Hermínia Nogueira e à sua neta Maria Manuela Fernandes. Ao acompanhamento um bom sumo.
No meio de dores físicas e psicológicas há afectos, espiritualidade, esperança, coragem, olhar positivo, vamos melhorar.
Óculos perdidos, óculos achados, no fundo da cama, embrulhados num cobertor de revistas e jornais.
Do Fundão, um apelo para se fundar um Núcleo da Liga dos Combatentes, anseio que paira naqueles que não esquecem o sofrimento da vida militar. Ainda haverá combatentes no Fundão? Da Liga de Combatentes de Castelo Branco, o sócio nº118857 recebe uma carta para participar, 15 de Junho, no “Convívio Primavera”, no Jardim Medieval da Sede, com jantar e Grupo de Fados de Coimbra - “Casa de Fado ao Centro.” Eu… aqui internado, sem ordens para ir a terras albicastrenses.
Na mesinha de cabeceira “Os Memoráveis” de Lídia Jorge, o “Islão e o Ocidente” de Jorge Nogueira Pinto, o “Horizonte Azul “de Wilbur Smith, este com uma dedicatória: “para o meu amigo António: para que o seu HORIZONTE seja infinito de saúde e alegrias, da colega e amiga Ângela.” Chorei sobre tantas leituras começadas e não acabadas.
Mais uma ida e volta ao Hospital Universitário de Coimbra, uma recolha de sangue durante 45 minutos. Seguirá para a Alemanha para análise. Viaja o meu sangue mas fica o meu corpo.
Bonito, linda iniciativa em Leiria, no Estabelecimento Prisional, no Pavilhão da Quinta do Lagar de El-Rei: vozes de coro e solistas reclusos interpretam obras de Mozart. Vão cantar árias de obras relacionadas com a natureza humana, o crime, o ódio, a morte e o amor.
Uma vizinha doente, de pijamas usados faz bonecas maravilhosas, fadas para colocar em berçários de crianças.
No refeitório conversamos entre nós: Deus criou o Homem ou foi o Homem que criou Deus? É como o ovo ou a galinha… Se Deus criou todos os animais, é provável que também tenha criado a galinha e, por conseguinte, as capoeiras e a canja. Falamos de Homero, Sócrates, Platão, Aristóteles… Um amigo doente diz-se discípulo de Sócrates, considera-se um “sócretino”.
Na sala de exposições do artesanato já há indicadores de que vêm aí as Marchas Populares, cordões e arcos com papel de várias cores.
Saudades das visitas da Matilde, hoje faz seis anos, desejo-lhe uma enorme felicidade.
Também houve aniversários noutras geografias: Iria (Lavacolhos), Sr. João (Russo), Maria da Luz, Ilda Campos, António Sousa Carvalho, Mila Brito (Aldeia de Joanes) Sr. Joaquim (Quadrazais), a minha Irmã Fátima, Victor Cruz (Setúbal), Amigo Zeca, da Casa Tininha (Fundão), Paula (Porto de Vacas - Pampilhosa da Serra), o Irmão Escuteiro Bento (Barco-Covilhã) e o meu filho Paulo Fernandes. Tão perto e tão longe de todos eles. Recordei-os e dei-lhes os parabéns.
Aqui o 137º Aniversário das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, e em Gouveia o 145º Aniversário da União de São João Batista.
É para reflectir: 55% das crianças não sabem saltar à corda no pré-escolar e no primeiro ciclo, não conseguem completar seis saltos consecutivos. Vivem no sedentarismo. Cada vez tenho mais saudades dos tempos que passei na Escola Primária da minha aldeia arraiana.
No obituário, partiu um ilustre homem do Telhado (Fundão), ALBANO MARTINS, poeta essencial e tradutor magnífico da poesia grega arcaica. Foi professor e fundador da Revista “A Árvore” e tem diversos livros publicados. Em vida recebeu a Medalha de Ouro do Município do Fundão. Sou um apreciador nato da sua poesia, mexe comigo a sua partida…
Fala-se num possível imposto às batatas fritas. Este Governo anuncia o fim da austeridade mas gosta que a gente faça dieta.
Tantos quotidianos… Deito-me a pensar nos verdadeiros amigos, nos convívios, nas cerejas do Fundão, no capoeiro das galinhas, no cumprimento dos cães, no cantar matinal dos galos, no põr-do-sol, nos vizinhos que partiram, no cultivo das hortas com feijão verde, pimentos, pepinos, tomates, abóboras, couves, cherovias, beringelas e cebolas que fazem chorar…
António Alves Fernandes
Aldeia de Joanes
Junho/2018