Interregno
Acordei ao som do marulhar de um lago
sem qualquer memória de um passado,
apenas uma presença,
estranha e envolvente
como os anéis que forma
uma pedra atirada à água.
Divergem, convergendo,
em pontos e vírgulas
ou algumas exclamações...
anseio pela quietude, sem pontuação
aliada a um desejo poderoso
de organizar o caos...
reescrever a vida com tinta da alma
e com a paixão mais profunda.
Cessou a ondulação. A pedra afundou.
Foi encontrar-se com outras, que já haviam sido montanhas um dia.
E dei comigo a vaguear pelas ruas,
pensando na pedra agora coberta pela água daquele lago...
finalmente estava imóvel
obteve a paz que eu procurava nessa caminhada.
Mas encontrei-a, de repente.
Estava só, sentada num banco de jardim
onde as lágrimas corriam céleres pelo seu rosto
numa tristeza intensa e desesperada.
- Como é possível que a Paz possa chorar assim? - perguntei surpreendida
- Quais as mágoas que em ti ocultas?
- Libertação - foi a resposta.
(Se a paz não é livre, que serei eu?...)
Quão tola fui, pensando que poderia evitar
que aquela pedra afundasse...
Foi só então que percebi
uma verdade inelutável:
Não podemos organizar o caos,
nem evitar o desespero,
nem reescrever o passado...
mas sem caos, passado e desespero, também não pode haver finalmente paz.