Moldagem
Tanto medo a gente tem
	de se expor tal como é...
	Escondemos da nossa mãe
	aquele "eu" de cabaré
	que não se mostra a ninguém.
	Ocultamos dos amigos
	nossos desejos mais sórdidos.
	Conservamos em jazigos
	quaisquer devaneios mórbidos
	que os outros achem perigos.
	E reprimem-se as ideias
	como quem encolhe um peido
	co'a força de panaceias.
	É melhor ficar retido
	com receio às diarreias.
	Não podemos destoar,
	há que seguir no carreiro.
	Ninguém p'ra desafiar
	nem que queira ser inteiro,
	nem erguer ondas no mar.
	Neste mar de ovelhas mansas
	que é o mundo actual.
	Não se ousa bailar danças
	que provoquem a moral
	ou possam chocar crianças.
	Nascemos de um só molde
	que tem um formato ímpar.
	Mas vem logo quem nos tolde
	de plástico d'embalar
	e nos force a contra-molde.
	E se ousas provocar
	os dogmas instituídos,
	ou se tentas afrontar,
	berrar, ou fazer ruídos,
	vêm mandar-te calar.
	E tu calas e consentes,
	ficas quieto lá na toca;
	Partem quantos são os dentes
	que tens em tua boca
	se te armas aos valentes.
      
Comentários
Henricabilio
5ª, 13/02/2014 - 11:08
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e assim vai o nosso mundo
e assim vai o nosso mundo repleto de rebanhos
de ovelhas mansas, a caminho do matadouro.
Belo poema! Boa qualidade de rimas!
Bom esforço para construir em redondilha maior!
Saudações!
_Abílio
Renato Laia
6ª, 14/02/2014 - 23:43
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Muito obrigado, Abílio!
Muito obrigado, Abílio!
Fico contente que tenha apreciado... Eu gosto de usar a rima, e raramente descuido a métrica, porque gosto demasiado que este tipo de poemas mais "formais" soem musicais. Por acaso neste em específico aventurei-me a não usar a quadra (como é típico), e optei pela quintilha. Confesso que não soa tão musical como a quadra. Talvez soe até mais "martelado", mas acabei por gostar, fica diferente!
Mais uma vez obrigado e abraço ;)