Meditação
A minha cabeça em Flor
Autor: Ex-Ricardo on Friday, 21 December 2012Tenho a cabeça aberta ao que não me cumpro...
O corpo descansa na cabeça futura;
espera, ainda, a casa que não encontro na estrada.
Um dia serei sem dias.
Não terei calendário.
Serei ao vento...
-reconforto-me.
As mãos perguntam a primavera...
O sol desaba como àgua ardente.
E eu limito-me a desabrochar...
Dizem-me que assim é...
...a natureza das coisas...
Dúvida
Autor: Nitocris on Wednesday, 19 December 2012Vejo a luz que me ilumina,
Difusa e ténue entre a vidraça embaciada!
Quero partir para o mundo de Além
E conformar-me com a ternura do Nada!
Imiscuo minha alma no vazio,
Cubro-me com um manto de negra dor.
Escondo-me nas brumas pantanosas do ser
Espero, silenciosa, a chegada do Amor!
Grito abafado no âmago do sentir,
Corro de encontro ao Mundo, perdida
Fujo de mim, do medo, do sonho
Perco-me silenciosa, nas agruras da vida.
Sorriso Audível das Folhas
Autor: Fernando Pessoa on Sunday, 11 November 2012Sorriso audível das folhas
Não és mais que a brisa ali
Se eu te olho e tu me olhas,
Quem primeiro é que sorri?
O primeiro a sorrir ri.
Ri e olha de repente
Para fins de não olhar
Para onde nas folhas sente
O som do vento a passar
Tudo é vento e disfarçar.
Tenho Tanto Sentimento
Autor: Fernando Pessoa on Sunday, 11 November 2012Tenho tanto sentimento
Que é frequente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Tomamos a Vila depois de um Intenso Bombardeamento
Autor: Fernando Pessoa on Saturday, 10 November 2012A criança loura
Jaz no meio da rua.
Tem as tripas de fora
E por uma corda sua
Um comboio que ignora.
A cara está um feixe
De sangue e de nada.
Luz um pequeno peixe
— Dos que bóiam nas banheiras —
À beira da estrada.
Cai sobre a estrada o escuro.
Longe, ainda uma luz doura
A criação do futuro...
E o da criança loura?
Vaga, no Azul Amplo Solta
Autor: Fernando Pessoa on Saturday, 10 November 2012Vaga, no azul amplo solta,
Vai uma nuvem errando.
O meu passado não volta.
Não é o que estou chorando.
O que choro é diferente.
Entra mais na alma da alma.
Mas como, no céu sem gente,
A nuvem flutua calma.
E isto lembra uma tristeza
E a lembrança é que entristece,
Dou à saudade a riqueza
De emoção que a hora tece.