Prosa Poética

NOTA ALTA

Numa nota alta solfeja a manhã suas coloridas efervescências
Pula de brisa em brisa orquestrando com tamanha excelência
O bailado sinfónico orbitando numa eclíptica palavra com eloquência
 
Numa nota alta lá vai o SOL aconchegar-se aos céus voláteis e amenos
Deixa com DÓ a vida esvair-se num LÁ flácido perfumado de uivos serenos
Ali gemem duas lágrimas pautadas no pentagrama dos afagos extraterrenos
 
FC

Solidão a dois

Nesta solidão a dois esbraceja o dia prenhe de uivos rudes e insensíveis
Coesos, todos os lamentos vadiam a milímetros da solidão tão horrível
Sem guarida as palavras embebedam-se no mosto dos silêncios indefiníveis
 
Nesta solidão a dois o tempo deixa ruborizados todos os beijos impossíveis
Com destreza afaga as lágrimas caindo qual colírio das horas remíveis
Sibila com a elegância hiperproteica das palavras etéreas e quase inaudível
 
FC

Vida paulistana

Saiu da casa dos pais, mas percebeu em pouco tempo o caos da vida adulta. A infância balsamada por doces, amigos e brinquedos infelizmente se perdeu. Disseram que se lutarmos muitos, podemos ter tudo o que queremos; chega a ser cômico, ele conclui. É mais sobre influência e egocentrismo.

Preconceito

Um dos temas que me despertam o interesse é o preconceito. A natureza humana é curiosa, usamos de artifícios baseados em sua própria primazia para justificarmos nossas mazelas. Escravizamos o outro em nome de uma abstrata nobreza racial. Os colonizadores tinham sobre a ótica do mundo uma lupa, e essa lupa enxergava o outro como formiga, não só enxergava como a exauria com a ‘’luz da razão’’. O pretexto racionalista levou o homem tão romantizado pelas poesias e eras de ouro a cometer pérfidas atrocidades.

E no meio de tanta gente...

Silêncio e tanta gente, esquecida numa multidão de ecos imprecisos
Uma rima castrada apunhalada por silêncios macabros e narcisos
Ver esfumar-se na fronteira do tempo sessenta segundos tão indecisos
 
E no meio de tanta gente queda e muda, espatifam-se palavras moribundas
Deambulam pelo calabouço das horas impreterivelmente furibundas
Improvisam a indigência das memórias agrilhoadas às noites tão vagabundas
 
FC

Ressuscita-me o silêncio

para sempre Gal
 
Entre complacentes murmúrios o tempo crepita flamejante e altruísta
Encurva-se saudando a manhã que desperta tão saudosa e reformista
Ressuscita-me este silêncio incrustado no parapeito das preces imprevistas
 
Qual bálsamo transcendente duas brisas perfumam essa voz tão pacifista
Na infinita metamorfose de luz fecunda-se um adeus sereno e coreografista
Assim se apascenta cada hora esvoaçando algemada a um sussurro calculista
 

Nas profundezas de um instante

No vasto abismo de silêncios hibernam sussurros tão prolépticos
São como latidos de um eco tão irreverentemente esquiço e epilético
O defenestrar de cada gota oceânica fluindo no algeroz dos uivos herméticos
 
Num instante cada instante colapsa incógnito efémero e complacente
Açucara a tempestade de palavras tão intemporais e prepotentes
Desenha o periélio de cumplicidades amarando entre maresias reverentes
 
Frederico de Castro

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