A REVOLTA DE NINGUÉM
Hoje não me apetece ser poeta,
Não me apetece escrever palavras bonitas
Bem casadas, pensadas,
Nem me apetece imaginar coisas belas
Nem colorir a vida de pensamentos loucos
Quero apenas ser eu ou melhor ser tu
Que caminhas por aí errante
Sem querer escravizar a esferográfica
De assassinar o papel ou maltratar
Um compêndio ou uma gramática
Não me apetece ler ouvir, olhar o horizonte
Tenho sede e vou apenas beber a uma fonte,
Não procuro a inspiração
Zanguei-me com a imaginação
Não quero fazer poemas
Nem quero obedecer a leis
Nem pintar papéis nem lemas
Não quero cantar nem sonhar
Quero vaguear, Quero ser livre
Quero viver sem algemas
Como um ermitão solitário,
Hoje não me apetece ser poeta
Não me apetece ser gente
Só quero ser o vento ou a chuva
Que caí livremente
Que não chora nem sente
Que não afirma e não mente
Hoje quero ser apenas eu
E escrever livremente até a mão me doer
E quando o papel acabar e a tinta secar
Ver o meu país a morrer e não lhe poder valer,
Hoje não me preocupo com ideias repetidas
Sejam passeios ou viagens
De chegadas ou de partidas
Experiências mal consumadas
Com palavras perdidas,
Hoje não me apetece ser poeta
Zanguei-me com os pontos finais
Com as vírgulas e com as demais
Quero viver a vida não quero senti-la
Quero explora-la livremente
Como toda a gente,
Quero andar por aí nu
Quero ser um simples mortal
Não quero ser eu nem alguém
Mas também não quero ser como tu,
Porque hoje apetece-me ser ninguém.