Profissão de fé

Não vão pensar que a minha musa seja
Alguma apparição allucinante
De olhar azul e labios de cereja,
Diadema d'oiro e espada flammejante.

A musa protectora d'estes versos
Detesta a rima altiva dos pamphletos,
Educa-me em principios bem diversos:
--Lê-me Petrarcha, o mestre dos sonetos.

Não me ensina a cantar imprecações
Contra as torpes gangrenas mundanaes,
Inspira-me sómente estas canções
Que vos fallam d'amor--e nada mais.

Apostolo do Bello e da Bondade,
Ella anda a propagar por toda a parte,
Ás almas auroreaes da mocidade,
A nova religião chamada--Arte.

Consagra um culto fervoroso e santo
Aos sentimentos bons, ás coisas mansas.
Respeita a Dor nas lagrimas do pranto,
Adora a Paz nos risos das creanças.

Por alta noite, quando a evoco e chamo,
Segreda-me ao ouvido brandamente,
Qual brisa leve a prepassar n'um ramo:
_Traduz em verso o que a tua alma sente._

_Canta os sorrisos, canta as amarguras
Dos teus vinte e dois annos incompletos.
Faz d'elles um collar d'estrophes puras,
Faz d'elles um rosario de sonetos._

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Já vêem, pois, que a minha musa é calma:
E agora, se quizerem lêr sem pressa,
Verão que em cada estrophe vae impressa
Uma affecção diversa da minh'alma.

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