LYRA XVI.
Eu, Glauceste, não duvido
Ser a tua Eulina amada
Pastora formosa,
Pastora engraçada.
Vejo a sua côr de rosa,
Vejo o seu olhar divino,
Vejo os seus purpùreos beiços,
Vejo o peito crystallino;
Nem ha cousa, que assemelhe
Ao crespo cabello louro.
Ah! que a tua Eulina vale,
Vale hum immenso thesouro!
Ella vence muito, e muito
Á laranjeira copada,
Estando de flores,
E frutos ornada.
He, Glauceste, os teus Amores;
E nem por outra Pastora,
Que menos dotes tivera,
Ou que menos bella fôra,
O meu Glauceste cançára
As divinas cordas de ouro.
Ah! que a tua Eulina vale,
Val hum immenso thesouro!
Sim, Eulina he huma Deosa;
Mas anîma a formosura
De huma alma de féra,
Ou inda mais dura.
Ah! quando Alceo pondéra
Que o seu Glauceste suspira,
Perde, perde o soffrimento,
E qual enfermo delira!
Tenha embora brancas faces,
Meigos olhos, fios de ouro,
A tua Eulina não vale,
Não vale immenso thesouro.
O fuzil, que imita a cobra,
Tambem aos olhos he bello;
Mas quando alumêa,
Tu tremes de velo.
Que importa se mostre chêa
De mil bellezas a ingrata?
Não se julga formosura
A formosura, que mata.
Evita, Glauceste, evita
O teu estrago, e desdouro;
A tua Eulina não vale,
Não vale immenso thesouro.
A minha Marilia quanto
Á natureza não deve!
Tem divino rosto,
E tem mãos de neve.
Se mostro na face o gôsto,
Ri-se Marilia contente:
Se canto, canta comigo;
E apenas triste me sente,
Limpa os olhos com as tranças
Do fino cabello louro.
A minha Marilia vale,
Vale hum immenso thesouro.