*A TORTURA DAS CHIMERAS*
Les édifices eloquentes...
Balzac
Quantas vezes, nas noutes pluviosas,
Ou nas limpidas noutes estrelladas,
Como espectros de espinhos e de rosas--
Erguem-se em nós as cousas apagadas!
Que vezes, n'esta vida positiva,
--N'esta comedia lugubre moderna--
Se eleva a outra esphera nobre e viva
Nossa alma mais poetica, mais terna!
Os contornos das cousas despresadas,
Um fundo triste, um muro, umas ruinas
Um mosteiro, um luar--nas almas finas
São como umas celestes madrugadas.
Quem não terá jamais sentido um dia
As gostosas torturas do _mysterio_
Surgindo, ao fundo, a mystica elegia
D'um nevado luar n'um cemiterio!
Sim, nestes climas lucidos do Sul,
Tão propenso ás visões sentimentaes
E ás chimeras--quem não terá jámais
Tido a cruel _melancholia_ azul?
Sim, quantas vezes n'uma tarde bella,
Á dorida eloquencia d'um castello,
D'um muro, não pensei nos Ceus, _n'aquella_
Que eu podia partir como um cabello!
Nuvens distantes, rubras, singulares,
Formas vagas... neblinas pardacentas,
Velhos musgos... azul... _cousas_ nevoentas
Sois causas de phantasticos pesares!
Quem não terá scismado em suas magoas
E amado as cousas mysticas, celestes,
Por um luar calado sobre as aguas
E um choroso sol posto entre os cyprestes!
No entanto sonhos vãos que nos prendeis
Qual prendem velho muro as verdes heras...
--É tempo brancas pombas que deixeis
Os laranjaes e as ruas das chimeras!
E é tempo que as torturas assassinas
Que nos rasgam melhor do que um punhal,
--Bem o sabeis mãos brancas, pequeninas!
Vos não junteis _miserias_ do Ideal!