AMOR E ETERNIDADE
Autor: Soares de Passos on Monday, 26 November 2012
Repara, doce amiga, olha esta lousa, E junto aquella que lhe fica unida: Aqui d'um terno amor, aqui repousa O despojo mortal, sem luz, sem vida. Esgotando talvez o fel da sorte, Poderam ambos descançar tranquillos; Amaram-se na vida, e inda na morte Não pôde a fria tumba desunil-os. Oh! quão saudosa a viração murmura No cypreste virente Que lhes protege as urnas funerarias! E o sol, ao descahir lá no occidente, Quão bello lhes fulgura Nas campas solitarias! Assim, anjo adorado, assim um dia De nossas vidas murcharão flôres... Assim ao menos sob a campa fria Se reunam tambem nossos amores! Mas que vejo! estremeces, e teu rosto, Teu bello rosto no meu seio inclinas, Pallido como o lirio que ao sol posto Desmaia nas campinas? Oh! vem, não perturbemos a ventura Do coração, que jubiloso anceia... Vem, gosemos da vida em quanto dura; Desterremos da morte a negra ideia! Longe, longe de nós essa lembrança! Mas não receies o funesto córte... Doce amiga, descança: Quem ama como nós, sorri á morte. Vês estas sepulturas? Aqui cinzas escuras, Sem vida, sem vigor, jazem agora; Mas esse ardor que as animou outr'ora, Voou nas azas d'immortal aurora A regiões mais puras. Não, a chamma que o peito ao peito envia Não morre extincta no funereo gêlo. O coração é immenso: a campa fria É pequena de mais para contêl-o. Nada receies, pois: a tumba encerra Um breve espaço e uma breve idade; E o amor tem por patria o céo e a terra, Por vida a eternidade!
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