CONSOLAÇÃO
Autor: Soares de Passos on Tuesday, 18 December 2012
Quando nas trevas de minha alma afflicta A procella da dôr mais se encapella, E o desalento, a dúvida, e a descrença Co'as negras azas me escurece o dia, A ti, ó Deus, a ti com mais esforço, Através do infinito onde te escondes Busco elevar-me, demandando auxilio; E tu, Senhor, descendo a quem te chama, Fulguras entre as sombras, e a tormenta Que dentro d'alma rebramia fera, Vae pouco e pouco serenando as iras. * * * * * Bem hajas! quem te procura Jámais te procura em vão: Tu desces, e a noite escura Se volve em doce clarão; Tu desces, e a luz da esp'rança, Como estrella de bonança, Brilha no mar da afflicção. A vida é triste: no mundo Soffremos até morrer; Mas, Senhor, quem sonda a fundo Mysterios do teu poder? A vida é triste, mas breve; E o futuro que se eleve, Eterno, immenso ha de ser. Mundos e mundos no espaço Vão rolando á tua voz, Prêsos em mystico laço N'esses jardins sobre nós; E tudo canta á porfia Aquella grande harmonia Que ensinam teus anjos sós. Tudo folga: só na terra Ha de o homem padecer? Acaso tão pouco encerra Seu fado? não póde ser. Se o homem foi obra tua, N'este mar em que fluctua Ha de um porto emfim haver. Bem hajas! a dôr e o pranto Vem de ti, do teu amor; São crysol augusto e sancto Que nos apura em fulgor; São a chamma, o fogo intenso Que nos ergue como incenso, E a teus pés nos vae depôr. Tu sabes porque sombria Vaga a noite na amplidão, Porque a terra se anuvia, E ruge irado o tufão: É que o dia segue a noite, E das procellas no açoite Se esconde a florea estação. Bem hajas, Senhor, bem hajas! O teu poder nos conduz; Se de luto um dia trajas, Outro dia além reluz. N'este gyro sempiterno, Vem o estio apóz o inverno, E apóz as sombras a luz. Bem hajas! feliz no mundo Quem tua face entrevê, E d'este abysmo profundo Se ergue nas azas da fé! Feliz quem sorrindo ás vagas, De olhos fitos sobre as plagas, Espera, confia, e crê!
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