A FONTE DOS AMORES
Autor: Soares de Passos on Thursday, 20 December 2012
Eis os sitios formosos onde a triste Nos dias d'illusão viveu ditosa; Eis a fonte serena, e os altos cedros Que os segredos d'amor inda lhe guardam. Oh! quantas vezes, solitaria fonte, Apóz longo vagar por esses campos Do placido Mondego, n'estas margens A namorada Ignez veio assentar-se, E ausente de seu bem carpir saudosa, _Aos montes e ás hervinhas ensinando O nome que no peito escripto tinha!_ E quantas, quantas vezes no silencio D'esta grata soidão viste os amantes, Esquecidos do mundo e a sós felizes, Nos extasis da terra os céos gosando! Pobre infeliz Ignez! breves passaram Os teus dias d'amor e de ventura. Ao regio moço o coração rendêras, E o que em todos é lei, em ti foi crime. Eis do barbaro pae, do rei severo, Se arma a dextra feroz, eil-o que aos sitios Onde habitava amor conduz a morte. Distante de teu bem, ao desamparo, Ai! não podéste conjurar-lhe as iras. Debalde aos pés d'Affonso lacrimosa Pediste compaixão; debalde em ancias Abraçando os filhinhos innocentes, Os filhos de seu filho, a natureza Invocaste e a piedade: a voz dos impios, Dos vis algozes, te abafou as queixas, E o cego rei te abandonou aos monstros. Eil-os a ti correndo, eil-os que surdos Aos ais, aos rogos que tremendo soltas, No palpitante seio crystallino, Que tanto amou, oh barbaros! os ferros, Os duros ferros com furor embebem. Prostrada, agonisante, os doces filhos Por derradeira vez unes ao peito, E de teu Pedro murmurando o nome, Aos innocentes abraçada expiras. Inda, infeliz Ignez, inda saudosos Estes sitios que amavas te pranteiam. As aves do arvoredo, os echos, brizas, Parecem murmurar a infanda historia; Teu sangue tinge as pedras, e esta fonte, A fonte dos amores, dos teus amores, Como que em som queixoso inda repete Ás margens, e aos rochedos commovidos, Teu derradeiro, moribundo alento.
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