TRES RETRATOS (Num album)
Autor: Bulhão Pato on Wednesday, 16 January 2013
Como as horas passam rapidas Nesta doce companhia! Brilha impaciente alegria Em tudo á roda de mim. Nunca fui tão venturoso, Nunca a mão da Providencia Fez com que eu visse a existencia Tão bella e risonha emfim. Esta noite, quando a lua No horisonte resvalava, Inspirado a saudava Nas balsas o rouxinol. Vem agora a primavera Abrindo o virginio manto, Cada dia um novo encanto Nos traz o romper do sol. Como a vida assim é bella, Nesta amena convivencia, Com tres anjos de innocencia De formosura, e de amor! Dezaseis annos talvez Não tem Julia, bem contados, Alta, airosa, olhos rasgados, E sorriso encantador. O pesinho estreito e breve Cinturinha delicada, A fronte um pouco inclinada, Com seu ar sentimental. Na ramagem das pestanas Occulta a traidora chamma, Que no instante em que se inflamma Dardeja um raio mortal. Mas que morte tão suave! Inda ha pouco, em certa hora, Que essa chamma seductora O coração me accendeu... Se é morte esquecer a terra, Naquelle instante morria, Por que tudo o que sentia, Era a ventura do ceo! Vel-a sorrir entre os campos, Bella, candida, animada, Como as flores que a alvorada De sua luz inundou!... Vel-a, co'as mãos impacientes, Afastar do rosto bello, O basto e fino cabello, Que a aragem desalinhou! Vel-a depois pensativa, Quando tibio o sol declina, Na corrente cristalina Os olhos negros fitar! Vagas sombras de tristeza Que vem toldar-lhe o semblante, São tão bellas nesse instante, Dizem tanto sem fallar! Laura, Elisa, as outras duas, Laura, pallida e morena, Baixa um pouco, mão pequena, Expressivas as feições; Os olhos claros e vivos, No seu brilho insinuante, Reflectem a cada instante Milhares de sensações. Eliza, a timida Eliza, Que innocente singeleza, Que perfume, que belleza Naquella face gentil! Cabellos loiros cendrados, Olhos d'esse azul escuro, Que é semelhante ao ceo puro De um bello dia de abril! As rosas da formosura Sempre vivas no semblante, O corpo esbelto e ondulante, Se é permittida a expressão; Uma tal ingenuidade, No seu todo se revela, Que em se olhando para ella, Bate alegre o coração. Tirados daguerreotypo Não ficavam mais exactos De certo estes tres retratos Que procurei desenhar; Qual porém é mais sympathico, Mais perfeito, deve agora Dizel-o a amavel senhora Do livro onde os vou deixar. Eu de certo não me atrevo! Nos olhos tem Julia a chamma Que nos sentidos derrama Torrentes de languidez! Laura... Eliza... mil encantos; Emfim, não sei qual prefiro, Não sei a que mais admiro, Sei que adoro a todas tres! Setembro de 1857.
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