Em memória do meu amigo Carlos Freitas (Carlão)

O meu amigo Carlos fechou os olhos no Domingo (03/06/2018).

Lutou até ao fim, no Sábado quando o fui visitar ao hospital para me poupar, disse - “Vai Miguel eu fico bem, estou em Paz”.

Conheci-o em novembro durante um internamento no Hospital da Universidade de Coimbra. A Doença do Carlos era incurável, incomparavelmente mais grave do que a minha, mas quem me dava força era ele.

Sempre que o visitava para jogarmos xadrez, ou para o tirar do hospital à hora do almoço, todos os dias sorria e contava episódios da sua riquíssima vida.

O Carlos nasceu em Angola, no seio de uma família abastada de agricultores de café, a sua propriedade devia ter mais ou menos a área do baixo Mondego!!! Frequentou a escola com bastante aproveitamento, tinha uma vocação inata para as letras. Falava corretamente Inglês, Francês, Russo…

Com o desenrolar dos conflitos em Angola fez formação militar na Rússia, tornou-se piloto de helicópteros m8. Depois de vários anos de guerra em Angola já não podia ver uma arma, fartou-se de guerra e deixou a sua carreira e o seu posto de Major.

Decidiu vir viver para a Nazaré onde se tornou um extraordinário artesão de artefactos de cabedal. Optou por viver uma vida simples, viver em paz.

Um dia quando estávamos internados e tomávamos café na entrada do Hospital disse-me:

- Miguel a melhor maneira que tens de enfrentar a vida é arranjares um saco.

- Um saco?

- Sim um saco!

- Repara… olha para as minhas costas? o que vês?

- Nada…

- Mas eu tenho um saco invisível atrás das costas! Todos os problemas que não consigo resolver mando-os lá para dentro. Depois com o passar do tempo e com muito cuidado pego numa pinça e resolvo um pequeno problema de cada vez, os que não tiverem solução ficam no saco invisível.

- De imediato percebi o que o Carlos queria dizer! pouco a pouco o saco vai ficando vazio…

- O Carlos voltou a falar, enquanto vocês, ocidentais, carregam um saco muito pesado a vida inteira, nós, africanos, somos mais leves e quando chegamos ao fim da vida temos o saco vazio.

Por isso Miguel, tudo o que não tiver solução manda para trás das costas, arranja um saco invisível meu irmão.

Até sempre meu irmão.

16:55

04/06/2018

MS

 

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