Ao Excellentissimo Senhor D. Lourenço de Lima...
_Ao Excellentissimo Senhor D. Lourenço de Lima, tendo promettido ao A.
que quando chegasse das Caldas, havia lembrar a mercê de se imprimirem
estas Obras_.
CARTA.
Ora do cume dos Montes,
Ora em suas verdes fraldas,
Hia estender os meus olhos
Na longa estrada das Caldas;
Sobre escumozos cavallos
Trotando empoada sege,
Disse quem fez os meus versos
=Ahi vem quem os protege;=
Alçando-me, hia a dizer-vos
=Senhor, chegou o meu prazo;
Honrastes hoje outros Montes,
Honrai agora o Parnazo;
Promettestes fazer ferteis
Seus estereis Mirto, e Loiro;
Promettestes que a Hypocrene
Levaria arêas de oiro;
Sua clara, inutil vêa
Réga chão, que não se lavra;
Vinde fazello fecundo,
Vinde cumprir-me a palavra.=
Mas, Senhor, não éreis Vós;
Era hum Casquilho, e do Povo;
Tornei a pegar nas Contas,
Tomei a esperar de novo;
Mil votos ao Céo mandava
Este humilde orador fraco,
Que vos não vissem Carreiros,[27]
Nem os ladrões do Tabaco;[28]
[Nota de rodapé 27: Allude ás Decimas da Enchára.]
[Nota de rodapé 28: Furto célebre feito naquella estrada.]
Então carrancuda Noite
Me enxotou co'as negras azas;
E em honra dos taes Amigos
Vim como Gato por brazas;
Sei, em fim, que já chegastes
Chamou por Vós minha dôr,
Venha o Illustre Conselheiro
Honrar-se em Procurador;
Fazer bem, he mór grandeza;
Deo-vos, tambem esta, o Pai;
Vós ambos d'entre os meus loiros
Cruas silvas arrancai;
Com piedoza Geografia
As Paternas mãos benignas,
Emendando ingratos Mappas,
Ponhão o Pindo nas Minas;
O Impressor gosta de Versos;
Quer que os meus públicos andem;
Mas he hum tanto acanhado,
Não imprime sem que o mandem;
Elle perdoa o contagio;
Pegai-lhe a minha doença;
Só deixarei de gemer
Em gemendo a sua Imprensa;
Assigne, pois, meu Avizo,
Pia, obedecida mão;
Mas não cuideis que com isso
Dais férias á protecção;
O mais ávido Leitor,
Das Quintilhas pregoeiro,
Ha de achallas insoffriveis
Em lhe custando dinheiro;
E só em nojoza Tenda
De Braguez Chatim mesquinho
Terão sahida os meus Versos,
Embrulhando o seu toicinho;
Só rapazes acharão
Minha Muza doce, e meiga;
Não porque tenha Poezia,
Mas porque teve manteiga;
Mettei, pois, Senhor, em brios
Ricos peitos avarentos;
Dizei, que comprem partidas,
Que he honra honrar os talentos;
Que serão, comigo, eternos
Se me evitarem o mal
De ir ao Templo da Memoria
Pela porta do Hospital;
E então da escondida burra
Ouvirá a surda aldraba
Não as vozes da Poezia,
Mas a voz de quem lha gaba;
Indo abrindo, juraráõ
A duas Artes odio, e medo;
A' da Guerra, em alta voz;
A' da Poezia, em segredo.
Entretanto ao digno Pai
Pedi que me faça Author;
Sejão públicos no Mundo
Meus versos, e o seu favor;
De Limas na honroza historia
Não serão titulos falsos
Fazer que as augustas Artes
Não marchem cos'pés descalços;
E Vós, firme Protector,
Fazei que por taes favores
Vamos beijar-vos a Mão,
Eu, e os meus dois mil Credores.