"Homoios"
Autor: Rute Iria on Thursday, 16 January 2025
concebo a vida sem as asperidades das relações humanas; sem as próteses oriundas das lutas terrenas; sem os desenganos que nos encharcam e que nos projetam para um mundo de inadaptados.
a grandeza que se introduz na alma dos poetas tem um lastro de dignidade que recebe uma ovação divina; tem uma porta escancarada para o sonho; tem uma mescla de júbilo e solidão que suscita a curiosidade alheia.
nomeio a textura crassa onde nos movemos para esclarecer os nossos conflitos íntimos e os nossos labores desditosos; os nossos inúmeros registos de sanguinolência; as nossas vitórias efémeras contra as leviandades e os destemperos.
os meus versos jorram as desventuras que atestam a existência humana; observam as atuações dos energúmenos que ofendem a minha sensibilidade; entrosam na malvadez abrangente para a abocanharem.
a cárie almeja introduzir-se no meu viver para restaurar as mazelas passadas; da exaltação da minha alma transvertida num pesadelo desbragado; das infâmias que abalroaram a minha candura.
transito pela farsa mundana para analisar as suas investidas contra a sensibilidade dos homens de bem: os traumáticos dilemas por ela impostos; os seus arrogantes encargos; as suas benesses envenenadas.
a sabedoria que me convém para avivar o inconsciente está nos versos que escrevo e nos dilemas que através deles vou resolvendo; está nas vicissitudes por eles desmembradas para que floresçam emoções aprazíveis.
os versos que ofereço aos leitores suprimem os truculentos alicerces humanos; ajuízam a sua história tenebrosa e sonham silenciá-la; imprimem na sua génese a minha serenidade vigente.