Á MULHER
Senhor da Força, nós, o heroe lendario,
Da Terra o domador, o sabio, o forte,
Dir-se-ia que jurámos ante a morte
Guerra d'irmão a irmão!...
Mais féros do que os tigres, destruimo-nos
A ferro, a fogo, a polvora, a metralha,
Deixando, pelos campos de batalha,
O sangue, a assolação!...
Mudou agora o Eterno ao mundo a rota
Que ha seculos trazia,... e novos astros
Despontam no horisonte, e em nossos mastros
Mais rutilos tropheus!...
Em vez da guerra truculenta e impia,
Impõe-nos por principio a Paz dos Povos,
Que impavidos demandam mundos novos,
Nova luz, novo Deus!...
Fechado para sempre o ferreo cyclo
Da guerra universal, obscuro berço
Do velho mundo barbaro, inda immerso
Nas lendas dos heroes:
Compete a Ti, Mulher, filha dilecta
De Deus, c'roar na Terra a grande obra,
Que em fulgido progresso se desdobra,
Á clara luz dos soes!...
Missão mais nobre á vida humana é dado:
Juntar e repartir de muitos modos,
Por cada um de nós, e em prol de todos,
Do Bem a eterna luz,
Fazendo com que caiam na nossa alma,
Qual chuva em messe loira e movediça,
N'uma missão d'amor e de Justiça,
Os sonhos de Jesus!...
Em vez da Força, Amor rege hoje o mundo!
E amor, tomando as gallas da Belleza,
As normas de Justiça, a mãe, a deusa
Das novas gerações:
Ao teu celeste influxo, posto á sombra
Da mãe de todos nós, a _Humanidade_,
A paz será na Terra, e na Verdade
Os nossos corações!...
Belleza e Amor, unindo-se, fizeram
Do teu mimoso ser um relicario,
Onde a mão do divino estatuario
Os sonhos seus guardou!...
D'encantos mil, conjuncto incomparavel!
A Deus já mereceste tal conceito,
Que só do amor divino do teu peito,
A vida confiou!...
Teu lindo rosto, espelho da sua alma,
Transporta-me a ideaes de tal apreço,
Que em frente d'elle extatico estremeço,
E ponho-me a scismar:
Se entre as ondas de graça e de belleza,
Que lançam sobre mim seus olhos ternos,
Está ou não occulto a bemdizer-nos
De Deus o proprio olhar!...
Tem jus as niveas formas do teu corpo
Ao flácido velludo, á fina seda,
Primor da industria humana que arremeda
As petalas da flôr!
Rainha! traja mantos d'ouro e purpura,
A doce perl'a, o fulgido brilhante,
E tudo quanto esplendido levante
Na Terra o teu amor!
Amor se symbolisa n'um menino,
Dos ceus gentil e alado mensageiro,
Trazendo atraz de si, como um cordeiro,
Pacifico leão!
O magico poder que a fera doma,
A força de que se arma esse innocente
És tu mulher, e a fera obediente
O nosso coração!
Conscia de Ti, das leis da vida, impera!
E aos pés verás as almas subjugadas!
Tem mais poder que o fio das espadas,
Um riso e olhar dos teus!
Que o teu propicio amor, dos ceus oriundo,
Nos doure a vida, a ampare, a dulcifique,
Nos faça com que a alma humana fique
Mais proxima de Deus!
1892.