BOABDIL - ULTIMO REI MOURO DE GRANADA

 

De Granada nas torres já se ergue
O pendão de Castella temido;
Boabdil, o rei mouro vencido,
Deixa a terra em que ha pouco reinou.
Do Padul ás alturas chegado,
Fez parar o seu timido bando,
E o corcel andaluz volteando
Taes adeuses á patria mandou:


«Ai Granada, lá ficas entregue
«Para sempre aos guerreiros de Christo!
«Quem teus fados houvera previsto,
«Ó sultana de tanto poder?
«Acabou-se o dominio dos crentes
«N'este solo tão bello de Hespanha;
«Não ha força de heroica façanha
«Que nos possa das ruinas erguer.


«De Toledo, de Cordova, e Murcia,
«De Jaên, de Baêza, e Sevilha,
«Eras tu, ó gentil maravilha,
«Que inda as glorias fazias lembrar.
«E perdemos-te, ó flôr do occidente,
«Do Xenil ó princeza formosa!
«E curvamos a fronte orgulhosa
«Nós, os filhos valentes d'Agar!


«Deus o quiz! nossa raça punindo
«Fez baixar o seu anjo da morte,
«E das iras d'Allah no transporte
«Baqueou nossa altiva nação!
«Nossos odios civis nos perderam,
«N'este abysmo fatal nos lançaram,
«E nem mesmo o valor nos deixaram
«De morrermos com nosso pendão.


«Ó guerreiros das eras passadas,
«Vencedores da Hespanha descrida,
«Lá n'esse eden feliz da outra vida,
«Vossas faces cobri de rubor!
«Este braço que ousou vossos louros
«Arrastar ante os pés de Fernando,
«Não ousou n'este peito nefando
«Embeber um punhal vingador!


«Deshonrado, do throno banido,
«Que me resta por sorte futura?
«Uma vida cobarde e obscura
«No paiz em que outr'ora fui rei...
«Nunca, nunca! o destino contrario
«D'além-mar nosso berço me aponta:
«Lá irei resgatar-me da affronta,
«Lá dos bravos a morte haverei.


«Para sempre adeus pois, ó Granada!
«Adeus, muros, e torres vermelhas
«Que brilhaes como vivas centelhas
«Nas verduras de tanto jardim!
«Adeus, paços e fontes d'Alhambra!
«Adeus, altas, soberbas mesquitas!
«E vós, thronos das luas proscriptas,
«Ó Comares, ó forte Albaicim!


«Para sempre, ai, adeus! té á morte
«Viverás n'este peito, ó Granada!
«Mas debalde, ó mansão adorada,
«Que estes olhos jámais te hão de vêr...
«Acabou-se o dominio dos crentes
«N'este solo tão bello de Hespanha;
«Não ha força de heroica façanha
«Que nos possa das ruinas erguer.»


Disse, e o pranto nas faces corria
Do rei mouro, dos seus que restavam.
Longe ao longe as trombetas soavam
Em Granada já feita christã:
Era o canto d'alegre triumpho
Em redor dos pendões de Fernando;
Era o grito d'Allah desterrando
Das Hespanhas os crentes do Islám.
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