A CIDADE CRESCE

A cidade cresce.

Os homens amesquinham-se entre os carros,

Que não têm por onde andar.

Árvores medrosas exibem nos ramos,

Folhas mortas de poluição.

E o homem, animal da orla da floresta,

Enfurece-se, qual fera cativa do cimento que o cerca,

Na nevrose quotidiana, que não ousa compreender,

Por indecifrável e vazia.

 

A cidade cresce.

As crianças surgem dos buracos das ruas.

Os drogados, vadios, abandonados,

Viram detritos nas portas de tascas e cafés.

Zoo anatómico, que a sociedade alimenta,

Para tema de conferências e capa de Jornais.

Não são futuro, mas presente

De quem não tem passado.

São o rescaldo vivo do incêndio imenso,

Que destruiu as árvores e os jardins.

 

A cidade cresce.

Cresce o ódio e a vingança.

Cresce o micróbio que, há muito, matou o amor.

Crescem tentáculos monstruosos,

Que sufocam o homem.

Nasce a máquina,

Vazia e possessiva, automática e nua,

Oleada a sangue.

Substituem-se jardins por andaimes,

Onde as máquinas se agrupam e desunem,

Construindo, pouco a pouco, a derrocada final.

A cidade cresce e expulsa o Homem.

 

Do livro VIVENDO O POENTE

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