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CONSCIENCIA
Para um homem que aspira
Ao ideal da Belleza,
Não ha maior tristeza,
Magua maior não ha,
Que vêr escurecer-se-lhe
O ceu da noite escura
D'alguma ideia impura,
D'alguma paixão má!
Paixão que muitas vezes
A luz da nossa Ideia
Accende, inflama, atêa,
E depois nos attrae
Com tanto magnetismo,
Com tal encantamento,
Que o homem n'um momento
Vacilla, cega e cae!...
Cae, sim, do seio esplendido
Do mundo onde vivia
Na mais doce harmonia
Em paz co'os dias seus,
Para apagada a febre
Do seu fugaz delirio,
Achar-se co'o martyrio
De te perder oh! Deus!
Sem Ti, meu pae, que assombro!
Que noite tão completa!
Que acerba dôr me inquieta
Meu fragil coração!...
Voltar a vêr a alma
D'esperanças povoada,
E achal'a transformada
Em lugubre soidão!
Senhor! se desabassem
Á tua vóz as bellas
E limpidas estrellas
Dos ceus que não teem fim,
Eu creio que assombrado
Do horrendo cataclysmo,
O Sol, d'além do abysmo,
Seria egual a mim!
Eu lembraria a aguia,
Que a prole ainda implume
Deixando sobre o cume
De monte erguido ao ceu,
A fosse achar de subito
Na rocha alcantilada,
No ninho, fulminada
D'um raio que desceu!
Egual seria o quadro
Da minha consciencia,
Ao ver a tua ausencia
Fazer-se em mim, Senhor!
Que em volta do teu astro
Minha alma de poeta
É pallido planeta
Buscando o teu amor!
E eu sem ti nem vivo!...
Tu és, oh, doce esperança,
O seio onde descança
Meu ser e afinal
Não sei até dizer-te
O quanto soffreria,
Se vira extincto um dia
Em mim, teu Ideal!
Oh não mil vezes antes
Em carcere ermo e escuro,
Achar-me de futuro
A sós c'a minha dôr;
Extincta a luz dos olhos,
E as bellezas do mundo,
E o ceu azul profundo
Com todo o seu fulgor!
Tu crê que nem demandam
Os mundos inferiores
Fócos de luz maiores,
Por esse infindo azul,
Como eu o eterno centro
Das leis da natureza,
Do _Amor_, e da _Belleza_,
Que são meu norte e sul!
Oh Pae! se n'algum dia,
Eu vir, n'uma miragem,
Alguma falsa imagem
Do Bem prender-me aqui:
Desvenda a tua face,
E mostra-me o teu seio,
Que, mesmo embora em meio
Do abysmo, irei a ti!
Irei, tão instinctivo,
Tão amoroso e firme,
Eu sinto a attrair-me
A ti o teu poder,
Que eu vejo em ti o Norte,
Para onde se encaminha
A pura essencia minha,
Que sente, pensa e quer!
Irei vencendo, indomito,
Innumeros attrictos,
E escolhos infinitos,
E infindos escarceus,
Como essa vaga enorme
Do mar que não recua,
Seguindo sempre a lua
Que vê passar nos ceus!
Irei bem como a Terra
Seguindo eternamente
O rumo do oriente
A demandar a luz;
Bem como Jesus Christo
O rumo solitario
Da senda do calvario
Á busca d'uma cruz!
Irei cá d'este mundo
Onde tu me cedeste
A dadiva celeste
Da Rasão e do Amor:
Raios vitaes que mudam
Em luz a nossa essencia,
E a luz em Consciencia,
E esta em ti, Senhor!
Lisboa, 1869.