*D. QUICHOTE*

A Luciano Cordeiro

     O que é isto?

Nos tempos medivaes dos campeões andantes,
E das balladas como a do bom rei de Thule,
Andava D. Quichote em busca de gigantes,
Magro, tristonho, ideal, crente Fausto do Sul.

Batalhador juiz da Virtude e do Crime,
Defendendo o opprimido, a mulher, o ancião,
Corria o mundo assim, ridiculo e sublime,
Em seu magro corcel, sob arnez de cartão.

Cheio de tradições, o velho mundo absorto,
Da banda do meio dia, ouvia o seu tropel,
E como insectos vis sobre um cavallo morto,
Riam as multidões do ultimo fiel.

Ia triste a scismar, com a alma abatida,
Nos caminhos do mal rasgando as illusões,
Magro Fausto do Sul, buscando a Margarida,
Cheio de apupos vis, d'escarneos e irrisões.

Vinha de batalhar espancado e abatido,
Cheio de contusões e lodos d'atoleiros,
E ao pé montando um burro, e o escudo já partido,
Sancho Pança a Materia, e o rei dos escudeiros!

Vinha sereno e grave, escarnecido e exangue,
Emmagrecido e caalmo em meio dos estorvos,
--Vinham ladrar-lhe os cães, e pressentindo sangue,
Grasnavam-lhe em redor bandos negros de corvos.

Sancho Pança fiel, vasculhava a escarcella,
E ascultava a borracha emmudecida emfim;
Em quanto o Heroe scismava, inclinado na sella,
Na conquista ideal do escudo de Membrin.

Paravam aldeões, lavradores crestados;
Vinham á porta as mães, fiando o linho fino;
E os magros charlatães viam passar, pasmados,
Na sombra d'um cavallo o extremo paladino.

Dançavam os truões; as sujas enxurradas
Com a lodosa voz, perguntavam: Que é isto?--
Satan n'um corucheu, dizia ás gargalhadas:
--Ó campeão do Bem! ó victima do Christo!

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