DE ORA AVANTE,,,

De ora avante…

Fica proibida toda a ideia de escravidão.

A dúvida perderá a forma de monstro,

Disforme e pegajoso, verde lodo.

Haverá sempre uma rosa vermelha no jardim;

Nove rosas vermelhas na secretária dos vivos.

Ninguém mais morrerá de inanição.

Não se poderá julgar louco qualquer sonho,

Mesmo arrumar carros nas árvores da praça,

Seguir pelas paredes nas horas de ponta.

Não haverá sonhos limitados à infância.

O homem fará amor na relva dos jardins

… Em noites de sol.

Correrá pelas ruas atrás do balão róseo

… Soltando gargalhadas.

Tudo será possível.

Voar de galho em galho,

Dormir recortado contra a lua.

Tudo será consentâneo com a palavra liberdade.

Exceto… monopolizá-la.

Roubá-la dos livros da biblioteca pública.

 

De ora avante…

Não haverá homens, prisioneiros do monstro

Da sombra de outros homens.

Não haverá grades amontoadas

No dia-a-dia dos vivos.

Tudo será possível.

Exceto… calar-se com razão.

Não haverá crianças chorando,

Mães tresloucada por terem filhos.

O menino deixará de ver a fera

No que a olha de cima do estrado.

E, a fera,

Refugiar-se-á na floresta densa das casas e das ruas.

Tudo será admitido.

Exceto… lançar bombas e napalm,

Na terra dos vivos.

 

De ora avante…

Os dias desfilarão nos dedos, como um rosário.

Todos serão dias de festa.

Haverá uma flor aberta no jardim,

Sem ser por acaso,

Um ninho de pintassilgo na roseira.

Haverá amor!

E os ontens, amontoados à nossa porta,

Serão, dia a dia, calcados, reduzidos a nada.

Tudo será possível.

Mesmo: Alimentar-se de amor,

               Drogar-se de paz,

               Embebedar-se de riso.

Tudo será admitido.

Até a mulher gorda da esquina,

Ter, nas tranças cinza, laços brancos;

Sentar-se como ontem, nos bancos da escola,

… Aprender com os netos.

Tudo será permitido.

Exceto… colher a flor do jardim,

Antes que nasça o Sol.

 

De ora avante…

Haverá vidros nas paredes das casas,

As janelas serão portas abertas para o dia,

Quais girassóis amarelos virados ao Sol.

Haverá crianças no jardim,

Segurando as paredes.

Bicicletas azuis correndo, entre balões vermelhos.

Virão novas manhãs, após cada noite de sol.

Tudo será possível.

Mesmo: Matar o homem velho do passado,

              O medo, a fome, a ira.

              A desconfiança entre iguais.

Tudo será admitido.

Exceto… morrer de inanição,

Na paragem do autocarro.

 

Do livro VIVENDO O POENTE

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