DESENGANO

 

Vejo-a ainda! resurge a meus olhos
Como em tempos ditosos surgia,
E, qual anjo de casta poesia,
Desce ás vezes n'um sonho d'amor;
Vejo-a ainda nos céos e na terra,
Nos encantos e risos da aurora,
E, se o dia nas ondas descora,
Das estrellas no meigo fulgor.


Era a luz que brilhava em minha alma,
Era o astro que em sombras luzira,
Era o fogo sagrado que a lyra
Ás doçuras d'amor acordou...
Tudo é findo; debalde nas trevas
Busco ainda seu facho luzente:
Foi apenas um astro cadente,
Meteóro fugaz que passou.


Pobre seio que ardente pulsaste
Embalado por falsas venturas,
O fanal que na terra procuras
Sobre a terra jámais acharás.
Não ha seio que entenda no mundo
Esse ardor de teus vagos anhelos;
Não ha luz que em seus raios mais bellos
Não te esconda uma sombra fallaz.


Que te resta? um futuro vasio
D'illusões que nutriu a esperança,
E um passado de triste lembrança
Como é triste a verdade sem véo...
Olvidar! olvidar! que ao presente,
Ai! só cabe o repouso do olvido.
Olvidar! e que em gêlo sumido
Seja o fogo que em chammas ardeu!


Sonho bello que esta alma illudiste,
Chamma ardente nos céos ateada,
Vôa, vôa á celeste morada!
Lá nasceste, do mundo não és.
E tu, lyra de languidas cordas
Que d'amor suspiraste em desleixo,
Vae, oh, vae! em silencio te deixo...
Vae, oh, vae para sempre talvez!
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