Esperança
Esperança
Quando a guerra chegar
numa manhã cinzenta, de odores pardacentos
vou ver os homens marchar
por caminhos lamacentos
sentindo o ódio jorrar, nos olhos
a raiva e a ira, já sangrentos
e ouvir as mães a chorar
os padres a gritar
que Deus não existe
acreditei que o mundo ia acabar
mas que dia este tão triste!!
A quem posso eu rezar
se já nem Deus existe!!
Onde vou eu reencarnar
... o ódio paira no ar
não se escutam os sinos tocar
ouço apenas os passos desesperados dos mortos
para as valetas por tapar
- Pai que criaste ?!!!
as crianças estão a morrer!!
- Porque falhaste?!!
vi a dor no meu espelho reflectida ...
Disseram-me para eu acreditar e ter esperança
... e eu acreditei, eu tive ...
disseram-me para ter fé
... e eu rezei ...
orei aos Deuses
que se salvem as flores e os oceanos
as florestas e os animais
que se salvem as crianças
e todos partam na arca
e os homens se amontoem no cais
Óh barca!! que me abandonaste no cais
navega, navega, vê por onde vais
... vi a dor no meu espelho reflectida...
invejei ser a estrela luminosa
que perdura infinita lá no céu
... longe, longe ...
que envolta no seu véu
nos mira e contempla
que dança à deriva e te indica o caminho
vi a esperança na arca
vi a esperança na minha alma reflectida
a esperança verte-me nos olhos secos
e entorpecido aceno-te do cais
vejo a esperança como me vejo a mim
e sinto-a em ti criança ... se tenho fé é em ti criança
... em ti...
II
- Sabes criança !!??
um dia escrevi
escrevi e tornei a escrever
senti o sabor salubre das palavras
acre ... destemido, escrevi ...
senti diferenças, preocupações
pelas maiorias, pelas minorias
por pessoas que não conhecia
porque precisava eu das palavras
se só no papel as definia
com ardor, com o fel que me ia no âmago
descobria-me, encontrava-me nelas
as palavras do meu mesquinho dicionário
necessitava delas arduamente
para desfiar a minha vida
como se fosse este o diário
que me guarda a alma perdida
- Sabes criança!!??
criei projectos, tantos projectos...
... os meus projectos ...
- quem não os fez?!!!
projectos que guardei na gaveta da cómoda
comodamente como eu
... rasguei-os da mente ... sonhados noites a fio
E os problemas, tantos problemas...
... os meus problemas ...
- Quem não tem problemas?!!!
os das maiorias, das minorias
indeléveis mágoas e desilusões
porque tenho a alma tão fria?!
a quem peço os meus perdões?!!
um dia sentindo a dialéctica
... sentei-me ...
sentei-me serenamente
a observar a demagogia
... senti-a rude, dura
tal qual a minha alma
fria, diabética ...
Estava cansado
... cansado de não me querer cansar
mas, sentia o cansaço
como o êxtase, a adrenalina, a euforia
brinca criança
brinca e sorri, criança de ténues tons
Ser adulto, criança!!
é ser brinquedo da realidade
já não há sonhos de criança
nem brinquedos de brincar
existe apenas a esperança
de na realidade se estar a sonhar...
... sabes!!?? os brinquedos com que brincas
os «legos», com que edificas e constróis
... os sonhos ...
à tua própria medida e criação
que por fim abandonas na sala
quando não queres mais brincar ... e feliz
recomeças uma outra reinação
tanto eu, como tantas crianças te estamos a invejar
eu por não ser criança, elas, por não terem brinquedos para brincar
ser adulto, é ser adulto
é criar e enfrentar problemas
é ser bombeiro ... soldado da paz
operário, carpinteiro
médico, professor, cozinheiro
não importa, tanto faz
... sê feliz ...
não destruas criança!!
edifica e constrói ... purifica
... os sonhos, as realidades ...
sê benemérito para com os necessitados
brinca criança
brinca e sorri, criança de ténues tons
Comentários
ronilda davidlo...
6ª, 01/08/2014 - 18:15
Permalink
Uma obra:
Que comove pela veracidade
expressa.