Fado / Fardo / Foda-se
Calminha, coração...
Vai com calma,
não te exaltes!
Que é que se passa?
Pensas que é por ti
que o mundo vai parar?
O mundo nunca pára,
seja por quem for,
muito menos por ti,
um ignóbil rastejante
que reptila as suas mágoas
à espera da pena alheia...
És um triste!
Faz-te um homem,
ainda vais a tempo.
Mas achas mesmo
que há alguém que se vai
dignar a esperar por ti?
O mundo nunca espera,
continua sempre a girar,
alheio a tudo e todos...
Estejas cá ou não estejas.
Para os outros?
Tanto se lhes faz!
És só mais um,
mais um empecilho,
mais um fardo pesado.
Não tens o direito
de chatear ninguém.
Então porquê chateares-te?
Ah pá, cresce e aparece!
Deixa-te dessas lamúrias!
Bebe mais uma, que isso passa...
Assim como tu passarás,
e não vai ser preciso muito tempo
para que mais ninguém te lembre.
És efémero como tudo na vida.
Um dia há em que desapareces
e, tirando tua família e os teus,
nem vai haver ninguém a dar por isso.
E mesmo os teus hão-de se habituar
e, eventualmente, deixar de se importar.
Tudo prosseguirá no ritmo usual,
sem grandes inquietações,
naquela indiferença morna e acutilante
de uma vaca melancólica que pasta.
Já dizia o outro: Tu és pó,
de lá vieste, para lá voltarás.
E sabes que mais?
Se te custa assim tanto
arrastares-te por este mundo
mais um bom par de anos,
Fica a saber que o fim é sempre
sete palmos abaixo de terra!
Portanto, não te exasperes.
Se assim te apraz,
sê esperto e toma já avanço,
toma o teu lugar moroso
na fila burocrática do limbo.
Ora faça-se o obséquio!
Olha lá ao fundo...
Já vejo o nó da corda,
prontinho a enrolar-se-te
no teu pescoço atónito!
Até já estou a imaginar...
O sufoco, lento, agonizante.
Mas não te apoquentes!
Vai ser assim para toda a gente.
Ou pensavas que ias sair
desta história vivo?
Ah, desengana-te, não saías,
assim até levas um avanço.