*A LENDA DAS ROSAS*
No principio eram mais doces os olhares
Socegados de Deus!
Era mais verde o manto destes mares
E mais azues os ceus!
Não tinha nuvens este sol na rota,
Nem tormentas o Sul,
Nem era, como o olhar d'um idiota,
Impassivel o azul!
Não choravam no val escuros casos,
Á noute, os tristes ventos!
Nem eram como hoje, nos occasos,
Os ceus sanguinolentos!
Deus não tinha vibrado ainda o açoute
A gerações inteiras,
Nem o Christo suára a longa noute
No Jardim d'Oliveiras.
Não andavam os tristes miseraveis
Torcendo os braços nùs!
Nem erravam na treva, inconsolaveis,
Os expulsos da Luz.
E não haviam sangue ainda chorado
Os santos nos desertos,
Nem no craneo do morto esverdeado
Inda lyrios abertos!
Não pisava inda um pé selvas umbrosas
E florestas bastas,
Os mares eram mansos!--sempre as rosas
Eram brancas e castas!
Não era côr de sangue assim vestida
Inda a rosa vermelha,--
Nem o ceu tinha a côr desvanecida
D'uma tunica velha.
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Toda uma noute, a Mãe primeira errante
E todo um dia andou!
Da noute a branca luz de diamante
Os passos lhe guiou.
E abandonavam seus pombaes as pombas
Seguindo-a pela estrada!...
E o mar dizia ao vento: Por que zombas?
Pobre mãe desgraçada!
E as montanhas choravam;--pois poderam
Prantos de mãe fendel-as!
E toda a noute pelo ceu correram
Mais tristes as estrellas!
E o mar tinha uma voz dorida, como
Na noute do Salem,
E quando o sol nasceu em rubro assomo
Arrastava-se a Mãe!
E perguntava ao vento: Onde está elle?
--Quem o meu filho viu?
E o vento respondeu:--Não sei d'Abel!
E o mar, ao fim, carpiu!
E arrastava-se assim no fim do dia--
Já quando toda exangue,
--Uma roseira avista que tingia
A côr rubra do sangue:
Então dorida estatua,--hirtos os passos,
Ai de mim! ai de mim!
Gritou, convulsa a Mãe, torcendo os braços,
«Aqui passou Cain!»
No principio eram mais doces os olhares
Socegados de Deus!
Era mais verde o manto destes mares
E mais azues os ceus!
E a Rosa era só _branca_, pura, exangue;
--Pois que como hoje assim
Não corrêra sobre ella ainda o sangue
Que derramou Cain!