Luar de janeiro, Fria claridade

Á luz delle foi talvez
Que primeiro
A bocca dum português
Disse a palavra saudade...

Luar de platina,
Luar que allumia
Mas que não aquece,
Photographia
D'alegre menina
Que ha muitos annos já... envelhecesse.

Luar de janeiro,
O gelo tornado
Luminosidade...
Rosa sem cheiro,
Amor passado
De que ficasse apenas a amizade...

Luar das nevadas,
Algido e lindo,
Janellas fechadas,
Fechadas as portas
E elle fulgindo,
Limpido e lindo,
Como boquinhas de creanças mortas,
Na morte geladas
--E ainda sorrindo...

Luar de janeiro,
Luzente candeia
De quem não tem nada,
--Nem o calor dum brazeiro,
Nem pão duro para a ceia,
Nem uma pobre morada...

Luar dos poetas e dos miseraveis,
Como se um laço estreito nos unisse,
São similhaveis
O nosso mau destino e o que tens...

De nós, da nossa dôr, a turba--ri-se
--E a ti, sagrado ladram-te os cães!

[Figura: A linda imagem pertence ao arruinado Mosteiro do Calvario,
d'Evora, e constitue a unica mas encantadora manifestação d'arte desse
pobrissimo convento. Foi doado ás monjas que o occupavam, por D. Izabel
Juliana de Souza Coutinho, forçada noiva de José de Carvalho, filho do
Marquez de Pombal. D. Izabel esteve enclausurada no Mosteiro do
Calvario, por ordem do duro ministro, até se resolver a acceitar a mão
do filho. Depois da morte do rei D. José, foi o matrimonio annullado,
vindo D. Izabel a formar o tronco da casa Palmella pelo casamento com D.
Alexandre de Souza. (Notas extrahidas dum artigo do erudito antiquario
eborense Sr. José Barata. In _Serões_, Junho de (1)907)

O menino Jesus será obra de Machado de Castro?]

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