LYRA V.
A caso são estes
Os sitios formosos,
Aonde passava
Os annos gostosos?
São estes os prados,
Aonde brincava,
Em quanto pastava
O manso rebanho,
Que Alceo me deixou?
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, tu chamas?
Espera que eu vou.
Daquelle penhasco
Hum rio cahia,
Ao som do sussurro
Que vezes dormia!
Agora não cobrem
Espumas nevadas
As pedras quebradas:
Parece que o rio
O curso voltou.
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, tu chamas?
Espera que eu vou.
Meus versos alegre
Aqui repetia:
O Eco as palavras
Tres vezes dizia.
Se chamo por elle
Já não me responde;
Parece se esconde,
Cansado de dar-me
Os ais que lhe dou.
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, tu chamas?
Espera que eu vou.
Aqui hum regato
Corria sereno,
Por marg[~e]s cobertas
De flores, e feno:
Á esquerda se erguia
Hum bosque fechado;
E o tempo apressado,
Que nada respeita,
Já tudo mudou.
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, tu chamas?
Espera que eu vou.
Mas como discorro?
Acaso podia
Já tudo mudar-se
No espaço de hum dia?
Existem as fontes,
E os freixos copados;
Dão flores os prados,
E corre a cascata,
Que nunca seccou.
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, tu chamas?
Espera que eu vou.
Minha alma, que tinha
Liberta a vontade,
Agora já sente
Amor, e saudade.
Os sitios formosos,
Que já me agradárão,
Ah! não se mudárão!
Mudárão-se os olhos,
De triste que estou.
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, tu chamas?
Espera que eu vou.