LYRA XIX.

Em quanto pasta alegre o manso gado,
Minha bella Marilia, nos sentemos
Á sombra deste cedro levantado.
    Hum pouco meditemos
    Na regular belleza,
Que em tudo quanto vive, nos descobre
    A sabia Natureza.

  Attende, como aquella vaca preta
O novilhino seu dos mais separa,
E o lambe, em quanto chupa a liza teta.
    Attende mais, ó chara,
    Como a ruiva cadella
Supporta que lhe morda o filho o corpo;
    E salte em cima della.

  Repara, como cheia de ternura
Entre as azas ao filho essa ave aquenta:
Como aquella esgravata a terra dura,
    E os seus assim sustenta;
    Como se encoleriza,
E salta sem receio a todo o vulto,
    Que junto delles piza.

  Que gosto não terá a esposa amante
Quando der ao filhinho o peito brando,
E reflectir então no seu semblante!
    Quando, Marilia, quando
    Disser comigo: _he esta
De teu querido pai a mesma barba,
    A mesma bocca, e testa_.

  Que gosto não terá a mãi, que toca,
Quando o tem nos seus braços, c'o dedinho
Nas faces graciosas, e na bocca
    Do innocente filhinho!
    Quando, Marilia bella,
O tenro infante já com risos mudos
    Começa a conhecê-la!

  Que prazer não terão os pais ao verem
Com as mãis hum dos filhos abraçados;
Jogar outros a luta, outros correrem
    Nos cordeiros montados!
    Que estado de ventura!
Que até naquillo, que de pezo serve,
    Inspira Amor doçura.

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