Noitibós

Noitibós

Se eu pudesse falaria contigo de noite sentado junto a um rio, um rio que imaginaríamos juntos num sonho profundo, um sonho real, sim, porque os sonhos são reais, tudo é real, por isso existem palavras, sons, peixes, pássaros, pedras, peras, nozes, laranjas, canas, árvores, rios... e a voz da tua alma.

Se eu pudesse viajaria sem parar para te encontrar nesse lugar distante onde estás, para te ver de noite quando te levantas, quando estremeces; falaria para ti, contar-te-ia uma história qualquer sem sentido para te acalmar, ficaria junto a ti sem saberes que era eu para que as águas do rio passassem devagar e límpidas, tudo seria silêncio e paz.

De manhã não te lembrarias de nada, terias a alma lavada como a alma das crianças que nadam nos ribeiros, como um pássaro que voa para se alimentar e dorme sem sonhar.

Se eu pudesse voltaria todas as noites sem saberes para te dizer que o mar não tem fim, que as árvores pensam e escondem os segredos dos homens, que existem pássaros que vivem de noite e de dia têm os olhos fechados por não suportarem a luz do Sol.

Voltaria para te dizer que a lua existe para os noitibós poderem voar entre as árvores enquanto vejo o brilho dos teus olhos na água do rio.

Miguel Sousa Santos

(14/10/2014)

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