O OUTOMNO
Autor: Soares de Passos on Saturday, 10 November 2012
Eis já do livido outomno Pesa o manto nas florestas; Cessaram as brandas festas Da natureza louçã. Tudo aguarda o frio inverno; Já não ha cantos suaves Do montanhez, e das aves, Saudando a luz da manhã. Tudo é triste! os verdes montes Vão perdendo os seus matizes, As veigas os dons felizes, Thesoiro dos seus casaes; Dos crestados arvoredos A folha sêcca e myrrhada, Cahe ao sôpro da rajada, Que annuncia os vendavaes. Tudo é triste! e o seio triste Comprime-se a este aspecto; Não sei que pezar secreto Nos enluta o coração. É que nos lembra o passado Cheio de viço e frescura, E o presente sem verdura Como a folhagem do chão. Lembra-nos cada esperança Pelo tempo emmurchecida, Mil aureos sonhos da vida Desfeitos, murchos tambem; Lembram-nos crenças fagueiras Da innocencia d'outra idade, Mortas á luz da verdade, Creadas por nossa mãe. Lembram-nos doces thesoiros Que tivemos, e não temos; Os amigos que perdemos, A alegria que passou; Lembram-nos dias da infancia, Lembram-nos ternos amores, Lembram-nos todas as flôres Que o tempo á vida arrancou. E depois assoma o inverno, Que lembra o gêlo da morte, Das amarguras da sorte Ultima gota fatal... É por isso que estes dias Da natureza cadente, Brilham n'alma tristemente Como um cyrio funeral. Mas animo! após a quadra De nuvens e de tristeza, Despe o luto a natureza, Revive cheia de luz: Após o inverno sombrio, Vem a florea primavera, Que novos encantos gera, Nova alegria produz. Os arvoredos despidos Se revestem de folhagem; Ao sôpro da branda aragem Rebenta no campo a flôr; Tudo ao vêl-a se engrinalda, Tudo se cobre de relva, E as avesinhas na selva Lhe cantam hymnos d'amor. Animo pois! como á terra, Tambem á nua existencia, Vem, após a decadencia, Ás vezes tempo feliz; E a vida gelada, esteril, Que o sôpro da morte abala, Desperta cheia de gala, Cheia de novo matiz. Animo pois! e se acaso Nosso destino inclemente, Em vez de jardim florente, Nos aponta o mausoléo; Se a primavera do mundo Já morreu, já não se alcança, Tenhamos inda esperança Na primavera do céo!
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