O PESO DAS CINZAS
O PESO DAS CINZAS
Do alto das suas copas
as árvores vêem a chama a nascer,
mas não gritam por socorro – nunca gritam.
Presas ao coração da Terra,
as nossas irmãs árvores
vêem o fogo a alastrar,
mas não fogem – nunca fogem.
Mansas e generosas, ficam à mercê
da fúria crescente das labaredas
que um sopro medonho,
vindo não sei de onde,
pulveriza, num momento.
O inferno é ali.
E não há braços que cheguem
nem água que baste
para suster a gula insaciável das chamas.
Como se uma potestade maligna,
de mão invisível,
se divertisse a manipular as chamas,
e os passos de fuga,
deitando sortes sobre os que deixa escapar
e os que hão de perecer neste inferno,
queimados vivos.
Consuma-se a tragédia.
E o céu assiste, complacente,
a este holocausto.
As famílias dizimadas
têm agora diante dos olhos
uma paisagem lúgubre
com esqueletos de árvores ainda de pé.
Difícil é suportar o peso das cinzas
e do silêncio – viver sem um gorjeio
ou o estalar de uma pinha.
Alice Rios
Junho/2017