PARA RECITAR AO PIANO

 

(Primeira)

      Era no outono quando a imagem tua
      A luz da lua seductora vi.
      Lembras-te ainda nessa noite Eliza,
      Que doce brisa suspirava ali?

      Toda de branco, em tua fronte bella,
      Rosa singela se ostentava então,
      Vi-te, e perdido de te ver buscava
      Se me apartava da gentil vizão!

      Era debalde; quanto mais te via,
      Mais me perdia delirante amor;
      Magicas fallas proferiste incerta,
      Toda coberta de infantil pudor!

      Tremulo, ancioso, quiz pedir-te um beijo
      Louco desejo pois fugir-te vi!
      Vendo-me triste para mim voltaste,
      Não me fallaste; mas eu bem senti!

      Fresca, arrobada de perfume a brisa,
      Lembras-te, Eliza? suspirava então;
      Tu nos meus braços reclinaste a frente,
      E meigamente me disseste: Não!

Setembro de 1852.




XXXV


(Segunda)

      De luz, de encanto, de alegria infinda,
      Aquelle rosto seductor esplende,
      Brilha a ventura em sua face linda,
      E vivo fogo o seu olhar accende!

      Como a existencia para nós é bella
      Entre a verdura d'esta amena estancia!
      Aqui suspira a viração singela,
      E esparge a rosa virginal fragrancia.

      Livres, immunes neste doce enleio,
      Dos gratos dias do saudoso abril,
      Ouvir das aves o infantil gorgeio,
      Gosar da sombra do enredado til...

      Ella a meu lado, sobre os meus cravando,
      Aquelles olhos cuja densa rama,
      Agora occulta, logo vai deixando,
      Brilhar o fogo da traidora chamma!

      Se entro no baile onde o prazer se agita,
      Eil-a, a formosa, no veloz passar,
      Louca os seus olhos nos meus olhos fita,
      E mil affectos me traduz no olhar!

      De luz, de encanto, de alegria infinda,
      Aquelle rosto seductor esplende;
      Brilha a ventura em sua face linda,
      E o ceo no fogo que esse olhar accende!

Abril de 1854.




XXXVI


(Terceira)

      Lembras-te, Elisa, quando a face pallida,
      Da casta lua despontou no ceo,
      E d'entre a balsa suspirada, e languida,
      Mavioso canto o rouxinol rompeu?

      Naquella noite em que o perfume vívido
      De mato agreste rescendia no ar,
      Em que as estrellas fulguravam timidas
      Nas doidas ondas do ceruleo mar!

      Lembras-te, dize, quando tu, mirando-me,
      Com todo o fogo de infantil paixão,
      Em voz sumida murmuravas: _Amo-te!_
      E me apertavas docemente a mão!

      E que eu perdido de ventura olhando-te
      Da meiga lua ao divinal fulgor,
      Teu rosto de anjo contemplava estatico,
      Candida pompa de inspirado amor!

      Nesse momento fervorosa supplica
      Do intimo d´alma murmuraste a Deus,
      Que amor, que encanto nos teus olhos humidos,
      Quando os cravastes na amplidão dos ceos!

      Depois sentada nos degraus de marmore
      Sombra encantada, celestial visão,
      Que meigas fallas proferiste tremula,
      Que mil protestos me juraste então!

      Depois as rosas que animavam vívidas
      Teu bello rosto, desmaiar eu vi
      E vaga sombra de tristeza subita
      Cerrar-me forte o coração senti!

Maio de 1853.
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