PERDOASTE!
Autor: Bulhão Pato on Tuesday, 15 January 2013
Anjo offendido; outra vez,
Volve teus olhos do ceo
Áquelle que te offendeu!
Vel-o abatido a teus pés,
Anjo esquece, e compassivo,
Num sorriso de perdão,
Torna a dar-lhe o coração.
A cada instante mais vivo
O remorso cresce em mim;
Perdoa, oh! perdoa, emfim!
Offendi-te num momento
De terrivel desvario;
Era o ciume violento!
O rubor da castidade
A tua face affrontava,
E eu cego, eu perdido, ousava
Proseguir! oh! por piedade,
Por piedade, anjo do ceo,
Perdoa a quem te offendeu!
Em breve a razão voltou,
E com ella essa anciedade
Do desgraçado que ousou
Num momento de loucura
Offender a divindade.
Nas trevas da noite escura,
Nem ao menos uma estrella,
Brilhava serena e bella!
E eu caminhava em delirio
Sem força para acabar
A vida que era um martyrio!
A tão profunda amargura
Quem me podia arrancar,
Quem, senão um teu olhar?
Lá, nas sombras do horisonte,
Despontou por fim a luz,
A mesma que em tua fronte
Bella e placida reluz.
No peito afflicto e cançado
Senti dilatar-se então
Este oppresso coração;
O teu olhar adorado
A mim outra vez volveu,
Terno, meigo, apaixonado.
Perdoaste, anjo do ceo!
Abril de 1857.Género: