*PHANTAZIA D'UM ABORRECIDO*

Eu vivo só das multidões distante,
E tenho um tom solemne grave e emphatico,
Amo Flaubert, Gostavo Droz e Dante,
Sou mysanthropo, hysterico e limphatico.

Sou phantastico, altivo, e caprixoso,
E tenho uns paradoxos meus protervos...
E entre elles conto um livro volumoso...
Em que explico o Remorso pelos nervos.

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Ás vezes vou pensando, ó tranças negras!
Quebrados, sensuaes olhos celestes!
Que has de ainda, entre as plantas verde-negras,
Morar debaixo, um dia, dos cyprestes!

E n'esses braços lisos, indolentes,
Hão de os vermes travar a escura guerra,
Hão de infundir pavor, inda, esses dentes,
E de beijos fartar-te a immunda terra!

Teu rir sem labios meterá assombros
--Ó tu que fazes rastejar as lyras!
E serão ossos nús teus lisos hombros,
Costumados ás leves cachemiras.

Que vezes scismo, assim quando tu passas,
E eu estou fumando ás portas dos cafés,
E que insultas as lepras e as desgraças,
Coberta de velludos e _plaquets_!

E eu penso ó corpo esculptural, perfeito!
Ó corpo de Phryné cheio de graça!
Que has de ainda ser putrido e desfeito,
E tomar-te azotato de potassa!

E não terás então, ó minha impura!
Serenadas debaixo das janellas,
E escondida no pó da sepultura
Terás medo dos olhos das estrellas!

Hontem, rojando estofos ruidosos,
Inclinada e indolente sobre o braço,
Comtemplavas com olhos cubiçosos,
As contorsões e saltos d'um palhaço.

E eu suffocando dentro os meus anhelos,
Soluçava d'amor, ó crua filha,
E exaltava-me o olor dos teus cabellos,
Onde escorrem perfumes de Manilha.

Mas eu heide vingar-me, ó tranças negras!
Ó cansados, mortaes olhos celestes!
Quando fores, nas plantas verde negras,
Morar debaixo, um dia, dos cyprestes!

Quando morreres, meu botão d'um dia!
Açucena que puz no peito o abrir!
Farei da tua tez fina e macia
Um prosaico barrete de dormir!

Farei da tua trança azevichada
Um _cachenez_, por causa dos catarros
E será no teu craneo, ó minha amada!
Que eu deitarei as pontas dos cigarros!

D'essa carne farei abertas rosas
Que enganarão as brancas borboletas!
E teus olhos, em jarras preciosas,
Olharão, como duas violetas.

Farei da boca um cravo, que no fraque
Porei sempre que saia de passeio...
E mandarei fazer um almanak
Na pelle encadernado do teu seio!

Forrarei as paredes do meu quarto
Com tuas longas cartas de namoro...
E ali passearei de illusões farto,
Como o avaro no meio do seu ouro!

E então tu serás _minha_, ó tranças negras!
Quebrados, sensuaes olhos celestes!
Quando fores, nas plantas verdes negras,
Morar debaixo, um dia, dos cyprestes!

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