Porquê?

Porque?

Pergunto-me vezes e vezes sem conta. 

A minha alma cansada espanta com a afronta. 

Nunca pensei que a saudade doesse tanto. 

Nunca pensei percorrer a dor e o seu recanto.

Mas dói que se farta. 

Embala comigo nesta vida de farsa. 

Percorre comigo a chuva fria que dos vales sombrios escassa. 

Nada faz doer menos. 

Nem o sol profundo a tocar-me na pequena cara.

Nem a música suave que antes alguém cantara.

Nem o chilrear dos pássaros roucos que outrora me acalmara. 

Nem o silêncio de madrugada avassaladora que outrora me levava. 

Tudo faz doer mais. 

A escura sombra do meu relexo desenha as tuas perfeitas curvas. 

O brilho do meu olhar negro deslumbra as tuas feridas turvas. 

Sei que estás ferido, quebrado em mil peças de betão. 

Por mais que eu quisesse, tu não deixaste que eu corasse teu coração. 

Então, porque vieste sabendo que nada podia fazer?

Porque vieste sabendo que me apaixonaria por ti outra vez?

Agora estou eu, criatura possuída, desfeita e corrompida.

Amargurada com esta vida. 

Sem ti já nada sou. 

Sem ti já nada existe. 

Porquê?

Pergunto-me vezes e vezes sem conta.

 
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