Quando Ninguém Mais Te Vê
Sentado na calçada,
Reconheço todos que passam.
Alguns nunca voltam,
Outros estão muito animados,
Muitos, nervosos ou impassíveis,
Todos me são familiares.
Nas suas costumeiras idas e vindas,
Às vezes me jogam uma moeda,
E nem percebem,
Muito menos me reconhecem.
A cidade, de novo, é pequena,
Fui embora, mas voltei,
Depois de alguns meses.
Nem minha filha — nem minha esposa
Sabe que quem está ali, à paisana,
É aquele por quem elas muito procuram.
Aliás, não procuram por mim,
Estão atrás do homem que eu era,
Capaz de trabalhar e amar,
Acima da média freudiana.
Agora o medo de gente
E os surtos recorrentes,
Levaram embora até a minha aliança,
Vendida para comprar alguns mantimentos.
Mas não tenho casa,
Não tenho móveis,
Tenho medo, muito medo.
E enquanto não me descobrem,
Apesar dos seus apelos por todos os lados,
Das redes ao rádio,
Vou vivendo de medo,
E não morrendo.
Vou tentando me encontrar, primeiro que eles,
Antes que me vejam.