QUOTIDIANOS – 10º CAPÍTULO

QUOTIDIANOS – 10º CAPÍTULO

Regresso ao Fundão, à minha actual Pátria, já ouço os latidos nocturnos dos cães de guarda nas  quintas, os galos quentes e madrugadores, “as cigarras a arder” como no verso do Eugénio de Andrade, cuja obra está em exposição na Biblioteca do Fundão, acompanhada de quadros e poemas inspirados neste figura maior da literatura portuguesa.

Leio um poema de Albano Marins, poeta do Telhado (Fundão), invocando as suas raízes: “passam lá ao fundo na estrada, os animais tardios. Vão sem destino e direcção. Lembrarás que foi assim a tua infância: um lugar, onde cabiam todos os lugares.”

Lauro António, realizador e coordenador do Festival Cine Eco em Seia, diz em Outubro de 2000 “que há compadrios organizados no cinema português.” Ainda se mantêm?

Observo com encanto as ruas engalanadas para receber o Festival Cale & Sangria Agosto com selo verde – o ambiente aprova e a natureza aplaude -, nas duas primeiras semanas deste mês, com música, gastronomia, teatro, artes visuais, artesanato…

Dizem-me que as pipocas são “invenção” de um frade, que algures na Europa deixou cair uns grãos de milho para uma panela e, quando reparou, tinha feito as primeiras pipocas.

Há anos um Presidente da Câmara de Abrantes passou a utilização da Piscina Municipal de dez escudos para duzentos. Passados uns meses estavam às moscas, os abrantinos foram refrescar-se nas águas do Tejo.

Vi fotografias antigas da Igreja Matriz de Aldeia de Joanes, com um relógio e um pequeno sino na parte superior da sacristia. Desapareceu, uma machadada no nosso património religioso.  Seria bom que alguém o lá recolocasse, no sítio onde nunca deveria ter saído.

Obituário. Os amigos partem, a dor fica. José da Brazia veio das bandas do presépio natural – Alenquer. Trabalhou como encarregado dos Estaleiros da ex-Empresa Lambelho e Ramos de Aldeia de Joanes. Ultimamente cruzávamo-nos e conversávamos na Biblioteca Eugénio de Andrade, no Fundão, onde vinha sempre à procura de notícias do seu Benfica, que lia de fio a pavio. Nos últimos contactos manifestou-me pesar por tantos amigos caçadores o terem abandonado, nem uma visita ou conversa… silêncio. Já não falámos mais de futebol…

A minha colaborada Enfermeira Emília da Conceição Cordeiro veio de Leiria, com grande estadia profissional em Lisboa. Durante alguns anos cuidou da saúde dos Reclusos no Estabelecimento Prisional de Castelo Branco e dos meus filhos. Está agora sepultada em Idanha-a-Nova…

Regresso a Castelo Branco com 45 graus à sombra. Vou e venho de comboio. Ainda vejo escadas empinadas nas cerejeiras, pomares com frutos em maturação, campos de milho e de feijão frade… terras onde pascem rebanhos à sombra. Mãos sábias do Dentista Caio tratam-me os dentes. No hall de entrada, um quadro com uma belíssima crónica – IR AO DENTISTA – do Prof. António Frade, um dos maiores cronistas do Jornal “A Reconquista”.

Já tinha saudades da Taberna “O Catorze”, onde o vinho era sempre servido acima dos catorze graus. Hoje um restaurante moderno em mãos de gente hospitaleira da Zona do Pinhal, Beira Baixa. Ainda lá vão, como no passado, agentes da PSP, das Finanças, dos Serviços Prisionais…emigrantes…. Come-se bem e barato.

Do Porto, carago, de mão amiga e familiar, chega-me o segundo volume de Manuel Leal Freire, “TROVAS DE ESCÁRNIO EM VERNÁCULO”, edição póstuma. Obra sarcástica, corrosiva, admirável, repleta de referências greco-latinas, clássicas, medievalistas, vinda dos territórios jocosos de Gil Vicente, Bocage, Camilo, Guerra Junqueiro, Natália Correia… “Aconselhável para adultos, com bolinha vermelha em cada página.” Parabéns à sua filha, minha familiar Guilhermina Leal.

Antes de regressar de Castelo Branco, passo pelo E.P., onde tenho alguns amigos, aí desempenhei funções profissionais com sentido de missão. Recebo o último Jornal d´“A Comunidade” que ali fundei. Li e gostei muito do editorial “ACREDITAR, SEMPRE!”

 

António Alves Fernandes

Aldeia de Joanes

Agosto/2018

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