SABOREIA OS INSTANTES
Dos instantes ditosos, céleres, saudosos
O sabor que fascina, que o tempo abomina,
Devagar vá sentindo antes que ele fugindo
Converta-se em saudade – a ferida da idade –
Que sangrará em vão quando a vil Solidão,
Seu reino levantar na mudez de teu lar,
Sem querer ser discreta ou, ao menos, poeta,
Mas aquela que varre teu riso, te amarre
Com seus acerbos braços, seus régios laços;
Mas aquela que chama qual funesta dama
Para ouvir esta fala em um canto da sala,
Que em sons anormais vai te dizer: - Nunca mais!
Saboreia com gosto os instantes efêmeros,
O cálice da emoção deixa, então, transbordar.
Ao lado deste amigo querido, mimoso
Seja feliz, não desperdiças os segundos
Com pensamentos vãos e olhares desnorteados.
Canta se te clamar o peito chamejante!
Deixa tua risada avançar nos confins
Daquele coração que se tornou teu ninho!
É frágil e derradeiro o momento solene
Desse caminhar sublime em tapiz doirado
Que, subitamente, finda-se, traz distâncias...
Distâncias que não param de crescer jamais!
Não creias nos refluxos, no turvo “outra vez“,
Quando puderes fitar os clarões do agora,
Que em breve serão mórbidos círios ao vento;
A página final do teu livro fagueiro;
Releia exausto, mas ávido, satisfeito...
Ela será mais tarde somente vestígios!
Qu`importa se é loucura teu jeito hodierno,
O que perfilhas e amas, e tens escolhido...
Saboreia a liberdade e o que tens sofrido,
Chagas maiores brotarão em teus cismares!
O teu segundo é o último, é folha outonal
Que murchará nos frios negrumes do passado.
As visões deliciosas que absorto cultivas,
Dá-lhes um vivente fôlego e sem pressa,
Delas consuma toda essência esplendorosa,
Pois terás quadras em que abatido pelo afã,
Muito lamentarás teus ensejos perdidos!
Saboreia o plácido sono e o acalanto...
Da irmã o beijinho, de teus pais a existência,
E tudo que só perdura na infinda angústia
De remar contra as correntes do torvo ocaso.
ALEXANDRE CAMPANHOLA