SAUDADE
Autor: Soares de Passos on Saturday, 24 November 2012
Assim, pallida lua, assim teu rosto Fulgurava tranquillo n'essa noite Em que o adeus lhe murmurei sentido; Quando, após os momentos preciosos Em que inda pude vêl-a, inda escutal-a, Afoitando meu animo indeciso, Sua trémula voz me disse: parte... Em tanto que uma lagrima furtiva Lhe escorria na face melindrosa, Mais pallida que a tua... Astro saudoso; Astro da solidão, quanto me aprazes! Eu amo o teu silencio, amo o teu brilho, Mais que do sol os importunos raios. Que me importa d'esse astro a luz e a vida, Se a luz e a vida me ficaram longe? Se em meio do rumor que o dia espalha, A voz não ouço que responde á minha? Estes valles, e selvas, estes montes, Á luz do dia, são talvez formosos; Mas não é este o ar que ella respira, Não são estes os sitios que ella encanta Com seu mago sorriso. O dia é mudo; Porém tu surges, solitaria amiga, Tu vens fallar-me d'ella, astro saudoso. Lua, d'esse aureo throno onde campeias, Tu vês os sitios caros. Que faz ella? Acaso, como pomba fatigada, Repousa adormecida? Verte, ó lua, Verte-lhe em torno o perfumado alento Que a noite rouba ás orvalhadas flôres. Mas não; talvez agora em mim pensando, Agora mesmo sobre o teu semblante Ella fixa tambem os olhos tristes, E nossos pensamentos, nossas vistas Se confundem em ti. Oh! não podermos, Adejando como elles n'esse espaço, Embora por momentos confundir-nos Em teu regaço, deslembrando a ausencia! Ao menos, astro amigo, ordena, ordena Que o anjo da saudade, que em ti mora, Desça, e lhe diga o que minha alma sente. Oh! quando solto d'importunos laços, Demandando outros céos, hei de já livre Vêl-a, ouvil-a, fallar-lhe? Quem o sabe? Mas tu entanto, confidente meiga, Em cada noite vem fallar-me d'ella; E em meu peito sombrio e solitario Derrama, envolto no teu doce brilho, O balsamo suave da esperança. Assim possas tu ser, benigna deusa, A invocada dos tristes; e se acaso Amas tambem, se algum remoto lago Entre floridas margens escondido Te prende as affeições, possas tu sempre No crystallino azul de suas aguas Sem nuvens espelhar teu rosto ameno!
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