*A Sombra*

Não tarda a sombra, ahi. Vae alto o Sete-Estrello
    São horas d'ella vir. Minha alma, attende!
    Que já a lua, a sentinella, rende
Na esplanada do céu, ás portas do Castello...

Oiço um rumor: talvez... Eil-a, é ella: ao longe, avisto
    Seu vulto em flor: postas as mãos no seio,
    Com o cabello separado ao meio,
Todo caido para traz, como o de Christo!

Sorri. Que linda vem, Jezus! Que bem vestida!
    Quantas lembranças d'este peito arranco!
    Foi assim, que primeiro a vi, de branco,
Foi n'esse traje que ella sempre andou, em vida!

Que luz projecta! Que explendor! Parece dia!
    Os gallos cantam, annunciando a aurora!...
    Ide deitar-vos que ainda não é a hora,
Dorme o teu somno, socegada, ó cotovia!

Mas vós, ó pedras, affastae-vos, que ella passa!
    Silencio, rouxinoes, eu quero ouvil-a...
    Terá ainda a mesma voz tranquilla?
Ah! ainda é o mesmo o seu andar, cheio de Graça...

Mas ao passar por mim, como d'algum perigo,
    Foge. (Talvez, já seja tarde...) Ó Clara!
    Nuvem! Phantasma! Ouve-me! Pára!...
E oiço a voz d'ella n'um murmurio:
        «Anda commigo...»

Coimbra, 1888.

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