TRISTEZA

      Como isto cá por fóra é tudo alegre!
      Quão bello o sol! que esplendida harmonia
               A terra, o mar e os céos!
      Porem dentro de mim que mundo á parte!
      Que embate de paixões! Que noite funebre!
               Que magoas, Santo Deus!

      Ai! se as manchas que o sol no rosto esconde
      Tem sobre o mundo alguem onde projectem
               A triste escuridão,
      Minha alma é como o espelho onde ellas caem,
      Tão profunda é a mágoa que me lavra
               Aqui no coração!

      E eu via ha pouco o azul d'um céo sem macula!
      E o sol d'esta alma fulgurante e limpido
               Banha-me todo em luz!
      Porém, franqueza humana! eu proprio o obrigo
      A alumiar-me com a luz da frouxa lampada
               D'um templo de Jesus!...

      Senhor! Senhor! que um teu olhar me alegre!
      Que lave o pavimento de meu peito
               De muita ideia vã,
      Que o mal é como a noite, e o sol apaga-a
      E transforma-a na prata, ouro e purpura
               Das nuvens da manhã!

      Oh! tu tristeza, irmã dos desgraçados,
      Que lanças no meu peito os ais plangentes
               D'esses gemidos teus!
      Desprende da minha alma as azas negras,
      E deixa entrar alegre a luz do dia,
               A luz vinda dos céos!

      E vós, filhos do sol, tribus innumeras
      Da familia de Deus, plantas e flôres
               Insectos e animaes,
      Que engolfados nos gozos do Universo,
      N'esse concerto immenso de harmonias,
               Nos céos a Deus louvaes:

      Ah! venho-vos tomar por meus mentores,
      Pois vale bem mais a luz do vosso instincto,
               Que a luz d'esta razão,
      Se eu não sei como vós viver contente,
      Trazer o azul dos céos na consciencia,
               E a paz no coração!

Lisboa

Na tapada d'Ajuda,

1869

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