Um passo a frente.
Um passo a frente.
Desde quando comecei a estudar, sempre prestei atenção em alguns personagens da história. Pessoas que viveram em épocas remotas e mesmo assim, com suas mentes além do seu tempo. Enquanto os adolescentes de minha época idolatravam figuras e pessoas que freqüentavam os noticiários de TV, eu investigava a vida e a obra de grandes pensadores do passado. Pessoas como Galileu Galilei, que por muitos anos tentou fabricar equipamentos que provassem suas teorias, coisas que tinha em mente. Leonardo da Vince que desenhava modelos de pára-quedas, numa época em que os homens ainda estavam aprendendo a voar. Esses homens sem dúvida pensavam em coisas e produziam conhecimentos para além do seu tempo, e esse detalhe muito me fascinava.
Ainda hoje tenho e sempre tive idéias loucas, coisas que a tecnologia hoje ainda não pode conferir. Mas foi no ano de 1974 que eu achei que estava ficando louco, ou então o mundo estava. Porque eu não podia concordar com a ignorância social instaurada e vivida naquela época. Senti-me então como alguém que está um passo a frente do seu tempo.
Morava na cidade Caruaru nesse ano. Às sete horas da manhã, num dia de semana cheguei à rodoviária para tomar um ônibus para o Recife. Nessa época o sensacionalismo policialesco já era corriqueiro nas TV’s e também nos programas das rádios locais. Bem na hora de começar o mais famoso dos programas de rádio, observei o corre-corre e um tumulto de pessoas se aglomerando para ouvir as últimas notícias policiais ocorridas na madrugada. De onde eu estava não podia deixar de escutar por conta do volume em que o rádio estava. Quando começou o noticiário, comecei a observar a reação das pessoas e os comentários preocupados que elas faziam enquanto o radialista noticiava os fatos. Neste dia eu realmente achei que, ou essas pessoas todas estão loucas, ou então o louco devo ser eu. Porque não posso eu acreditar, nem concordar com tamanha aberração que tanto preocupava aquelas pessoas.
A notícia que os deixou em pânico foi a história de uma perna cabeluda que andava dando chutes nas pessoas, e inclusive corria atrás de algumas. Eu não podia acreditar no que eu via ali. Pessoas altamente preocupadas, e com muito medo de uma perna, que sozinha, sem o resto do corpo andava de madrugada nos bairros da cidade a chutar as pessoas. Isso pra mim era de uma ignorância sem precedentes. Como eu via que todos ali acreditavam, menos eu, então eu pensei, devo mesmo estar louco, ou o resto do mundo é quem está. As pessoas realmente acreditavam naquela história ridícula.
Descobri depois que sendo aquela época ainda no regime militar, os radialistas eram impedidos de noticiar corretamente os fatos por conta de uma censura imposta pelos militares governantes, então noticiavam fatos ocorridos e atribuíam não ao personagem em questão e sim a uma perna cabeluda. Desse modo a censura não podia detê-los. Só que as pessoas realmente acreditavam na tal perna cabeluda, que ela de fato existia e chutava as pessoas que andavam de madrugada pelos bairros da cidade. Então na cidade havia uma espécie de toque de recolher por conta da tal perna cabeluda.
Já em minha fase adulta continuei vendo coisas tão ridículas quanto aquela história, mas que as pessoas acreditam e veneram como sendo verdades absolutas. São também coisas esdrúxulas e criadas para cercear as mentes das pessoas do meu tempo, só que ainda funcionam muito bem. Em especial sobressaem as crenças religiosas, crendices e sincretismo.
As idéias loucas nunca me abandonaram e em 1979, quando comecei a trabalhar com informática nos velozes computadores de grande porte daquela época, novas idéias vieram a tona aos montes. Alguns anos mais tarde, já na era dos microcomputadores descobri a física quântica. Percebi então que minhas idéias loucas não eram tão loucas assim, só estavam em um tempo diferente do tempo possível para que elas se tornassem praticáveis e exploráveis. Quando me tornei professor de informática as pessoas, (alunos), achavam minhas idéias por demais avançadas e impossíveis. Em 1980 eu já falava em tecnologia de GPS e aparelhos pequenos que poderiam trabalhar com imagem, som e conexão de viva voz como nos celulares de hoje. Para aquela época aquilo era inviável e impraticável, pois não havia condição ainda de a tecnologia acompanhar as coisas que eu já pensava na época.
Mesmo agora no ano de 2013, tenho ainda dezenas de idéias loucas que nesse tempo ainda não há condições para serem exploradas, explícitas e ou colocadas em prática. Não somente no campo da tecnologia como também no campo social e filosófico deste momento. Diante as idéias loucas que ainda tenho, encontro-me neste momento da história ainda como que a um passo a frente.
Charles Silva