*A UMA ANDORINHA*
Nas brisas da tardinha
Pára teu vôo um pouco;
Ouve um poeta, um louco,
--Escuta-me andorinha!
Um pouco deixa os ninhos;
Attende as vãs loucuras,
--Tambem nas sepulturas
Vôam os passarinhos!
Nem sempre o azul ethereo
Quaes flexas vão cortando,
--Tambem riem, voando,
No chão do cemiterio!
Lavam os pés rosados
Nas urnas funeraes;
--Tu, mesmo, nos telhados
Moras das cathedraes!
Não fujas d'um poeta,
Que ha nuvens mais sombrias!
--Tu já moraste uns dias
No nicho d'um propheta!
Por tanto, tu que adoras
A primavera e o Sul,
Dize-me,--no alto azul,
Quem faz sempre as Auroras!
Quem dá tintas vermelhas
Ao Sol poente que arde?
--Quem coze as nuvens velhas,
E accende o astro da tarde?
Os campos dão renovos
Tambem, n'outras espheras?
--Quem faz as primaveras?
--Quem faz os astros novos?
Quem faz a ave-flor?
Quem tinge o temporal?
--Quem faz a pomba, côr
Do lyrio virginal?
No Sol ha violetas,
E rios, campos, vinhas?
--Dize, se nos planetas?...
Tambem ha andorinhas...
E tu que mais almejas?
Tens sol, astros e ninhos--
Tens tudo o que desejas...
--Luz, grãos, pelos caminhos!
Ó triste ambicionar!
Ó santo e vão delirio!
--Talvez, ó filha do Ar
Quizesses ser um lyrio!