VAES PARTIR!

 

      Vaes partir! cada instante que passa
      Aproxima o adeus derradeiro,
      Para mim neste mundo o primeiro,
      Que teus olhos proferem aos meus!
      Vaes partir! nessas morbidas palpebras,
      Treme agora uma lagrima anciosa,
      Já deslisa na face formosa,
      Já teus labios me dizem adeus!

      Vaes partir! contemplar esses campos,
      Que o sol vivo de abril illumina,
      Ver as relvas da alegre campina
      Já cobertas agora de flor.
      Escutar as estrophes sentidas
      Que de tarde improvisam as aves,
      Recordar os instantes suaves
      De outros dias de encanto, e de amor.

      Vaes partir! vaes tornar aos logares
      Testemunhas de um ceo de delicias,
      Que em suaves risonhas caricias,
      Para nós neste mundo brilhou!
      Cada flor, cada tronco viçoso,
      Cada espaço de relva florída
      Vae lembrar-te uma scena da vida,
      Um momento feliz que passou!

      Quando for aos clarões da alvorada
      O perfume das plantas mais brando,
      Quando as aves voarem em bando,
      E cantarem ditosas no val;
      Quando as aguas correrem mais vivas,
      Pelo verde declivio do monte,
      Quando as rosas erguerem a fronte
      Animadas de um sopro vital...

      Que saudade! ai que funda saudade
      Has de ter d'esse tempo encantado,
      Em que bella e feliz a meu lado
      Viste as pompas da terra e dos ceos!
      Quando a aurora era a pura alegria,
      Uma vaga saudade o sol posto,
      Quando meigo sorria teu rosto
      Se eu fitava meus olhos nos teus!

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      Vaes partir! cada instante que passa
      Aproxima o adeus derradeiro,
      Para mim neste mundo o primeiro
      Que teus olhos proferem aos meus!
      Vaes partir! nessas morbidas palpebras,
      Treme agora uma lagrima anciosa,
      Já deslisa na face formosa,
      Já teus labios me dizem adeus!

Abril de 1855.
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