Vida Em Claro

Chego do emprego tarde a casa,
Venho cansado que nem um cão,
Sinto uma moleza que me arrasa,
Estendo-me ao comprido no colchão.

Porém o sono tarda em pegar,
Coisa que vem sendo recorrente,
Antevejo a insónia a chegar
E trago o cérebro tão dormente!

Dou voltas e revoltas na cama,
Nada há que me faça dormir.
Levanto-me do leito (Que drama!)
E vou à varanda distrair.

Queimo cigarro atrás de cigarro
Inspirando, raivoso, a fumaça.
Horas passam num vagar bizarro
Durante outra noitada sem graça.

O relógio dá a meia-noite,
Ouve-se ressoar o badalo,
Gasta-se a noite, renasce o dia
Ouve-se ao longe o cantar dum galo.

É já dia, já veio a manhã!
Finalmente venceu-me o cansaço...
Chega o sono em pézinhos de lã,
Do tabaco já só sobra o maço.

Deixo-me cair entre os lençóis,
Absorvo o fresco que a cama tinha,
Mas toca logo o despertador,
Essa tão estridente campainha!

Nem deu tempo de fechar os olhos
Este meu tão breve dormitar,
Nem deu p'ra saber da cama os folhos,
Ando há dias sem descansar...

Chegou o tempo de levantar
Ainda eu não pude dormir nada,
Urge a pressa p'ra ir trabalhar...
Que vida esta! Mas que massada!

Vou andando em piloto automático
A caminho dum reles trabalho,
Sinto o corpo num queixar somático
Relembrando-me que eu nada valho...

Começo o execrável ofício
Que me vai dando para comer,
E permite sustentar o vício
de ver os cigarros a arder.

Mas é este um labutar sem gozo,
e quando é sem gosto, muito cansa.
Passo o tempo num sofrer penoso
E em mim só o desespero avança!

Como tudo isto é detestável,
Ter que trabalhar para viver!
Esta vida é tão abominável...
Só queria poder desnascer!

Ao menos que m'ajudasse o sono,
E que eu pudesse, enfim, descansar...
O dormir largou-me ao abandono
Deixou-me, azoado, a definhar!

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retalhos de uma vida difícil

(de que outro podia ser).

 

Saudações desde Caldas!

 

_Abílio