A VISÃO DO BAILE
Autor: Bulhão Pato on Friday, 18 January 2013
Foi num baile que a viste cercada De perfumes, de luz, de harmonia, Onde viva, impaciente alegria, Nos semblantes andava a saltar; E ella triste, abatida, indolente Entre as pompas da festa encantada, Co'a tristeza na face estampada, E infinita saudade no olhar. Ai! que luz! que expressão nesses olhos Quando instantes nos teus se cravaram! De repente em tropel acordaram Mil affectos no teu coração! E debalde a seu lado quizeste Revelar o que n'alma sentias, As palavras, a voz eram frias Para aquella infinita paixão. D'essa noite os instantes voaram, Entre amor, entre gloria e ventura, E no fim com que immensa ternura, Seu olhar para ti se volveu! É que havia chegado o momento De deixar essa estancia inundada Dos primeiros clarões da alvorada, Que já vinha rompendo no ceo Mas depois, quando o sol d'esse dia Desmaiava nas veigas virentes, Quando as aves soltavam gementes A voz doce nas balsas em flor, Não a viste assomar á janella, E sorrindo, mirar-te um instante? Não brilhava naquelle semblante, Um sublime reflexo de amor!? No sonoro recinto do templo Quando as preces sinceras subiam, Quando os hymnos sagrados se ouviam Aspirando suaves aos ceos, Não ouviste dizer-lhe: «Sou tua, Ante Deus, ante os olhos do mundo Que este affecto suave e profundo, Vem do ceo e é bemdicto de Deus!» Hoje pois, que na luz d'esses olhos, Nessas fontes de amor e candura, Encontraste na terra a ventura, Cuidas tu em deixal-a, e partir? Oh! não vês que é fatal o destino, Que chegou para ti essa hora De encontrar a mulher seductora Que te deve encantar o porvir? Ai, poeta, debalde procuras Esquecer a visão adorada; Ai! debalde! tua alma inspirada Outra igual neste mundo encontrou! São irmãs, e co'a mesma ternura Viverão abraçadas no mundo, Num affecto sincero e profundo A suprema vontade as juntou! 31 de Março de 1857.
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