Você

Você é o engulho que me dá

quando passo pelo mar.

Você é o engasgar que me acomete

quando como apressado.

Você é o tropeção que me surpreende

quando ando sem cuidado.

Você é a topada no pé que me dói

quando esqueço de olhar para baixo.

Você é a mosca na sopa que cai

quando estou a saboreá-la.

 

Você é a quimera das dores

que se esgarça

por entre as minhas pernas

no meu pênis.

Você é o meu chafurdar na lama

de porcos doentes no quintal.

 

Você é a fábula  de nomes

e datas que, infinda, jaz inerte

quando se desfraldam

a lista dos culpados.

Você é a liberdade vigiada

dos presos em agonia assistida

no cárcere da vida.

 

Você é o respeito morto

pelos cadáveres de homens públicos

que viram nomes de praça.

Você é o roçagante andar,

trôpego da mulher,

depois de um estupro.

 

Você sou eu

que esforça-se por ser normal,

enquanto lances de jogadas sinistras

são desferidos no tabuleiro de xadrez

do Deus de  barbas longas da Bíblia.

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